A 8ª Turma do TST concluiu que não é possível rever cláusula de acordo relativa a multa pelo não pagamento ou pagamento em atraso das parcelas de um acordo.
No caso concreto, houve o pagamento do acordo, mas com atraso, tendo o Juiz de Primeiro Grau e o Tribunal Regional rechaçado a possibilidade de aplicação da multa.
Segundo a decisão de relatoria da Ministra Dora Maria da Costa, a decisão homologatória do acordo faz coisa julgada, sendo imutável (art. 5, XXXVI, CF), e que o artigo 879, parágrafo 1º, da CLT, prevê que não se poderá modificar a sentença liquidanda.
A decisão concluiu que “o Regional, ao concluir indevida a multa controvertida, violou a coisa julgada, haja vista que, conforme supramencionado, o título executivo judicial expressamente consignou a incidência da multa em caso de descumprimento do acordo, cabendo-se registrar que não se pode interpretar título judicial, mas apenas cumprir o respectivo comando” (Processo 1576-07.2015.5.17.0001).
A questão do cumprimento dos acordos judiciais tem sido ventilada ultimamente, em razão das dificuldades econômicas oriundas da pandemia. Chegou a ser inserido no texto da Medida Provisória uma previsão de parcelamento dos acordos judiciais em 60 (sessenta) parcelas, mas a medida provisória acabou caducando.
Trabalhadores e empregados, fiquem atentos!
Segue o texto da decisão:
PROCESSO Nº TST-RR-1576-07.2015.5.17.0001
RECURSO DE REVISTA. EXECUÇÃO. ATRASO NO PAGAMENTO DE PARCELAS DE ACORDO
JUDICIAL. MULTA. OFENSA À COISA JULGADA CONFIGURADA. A imutabilidade da coisa julgada material é protegida pelo inciso XXXVI do art. 5° da CF. Logo, uma vez proferida a decisão de mérito, transitada em julgado, perfeita se torna a coisa julgada material, gozando o comando sentencial de plena eficácia, e sendo inalterável pela via recursal, pois já se encontra esgotada. O Regional, ao concluir indevida a multa prevista em acordo judicial, violou a coisa julgada, haja vista que o título executivo judicial expressamente consignou a incidência da multa em caso de descumprimento do acordo, cabendo-se registrar que não se pode interpretar título judicial, mas apenas cumprir o respectivo comando. Recurso de revista conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso
de Revista n° TST-RR-1576-07.2015.5.17.0001, em que é Recorrente ADAO FERNANDES PASSOS e são Recorridos F.L BRANDAO - ME, BELARMINO DUARTE BRANDAO e METALURGICA FELIPE LTDA - ME.
O Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região,
mediante o acórdão prolatado às fls. 471/474, negou provimento ao agravo de petição interposto pelo exequente.
Inconformado, Adão Fernandes Passos interpôs recurso
de revista postulando a reforma do julgado.
Pela decisão de fls. 516/517, o recurso foi recebido,
por possível ofensa ao art. 5º, XXXV, da CF.
Não foram apresentadas contrarrazões.
Dispensada a remessa dos autos à Procuradoria-Geral
do Trabalho, nos termos do art. 95 do RITST.
É o relatório.
V OTO
I - CONHECIMENTO
Preenchidos os pressupostos comuns de admissibilidade
recursal, examinam-se os específicos do recurso de revista.
EXECUÇÃO. ATRASO NO PAGAMENTO DE PARCELAS DE ACORDO JUDICIAL. MULTA. OFENSA À COISA JULGADA CONFIGURADA.
Eis os fundamentos adotados pelo Regional:
“2.2.1. MULTA POR DESCUMPRIMENTO DO ACORDO.
ATRASO NO PAGAMENTO DE PARCELAS
A r. decisão agravada foi proferida nos seguintes termos:
O exequente requer a aplicação da multa em razão do inadimplemento do acordo firmado nos termos da ata de Id d250987.
Por sua vez, o reclamado informa que não deixou de pagar o acordo nos dias acertados, não por sua maldade e simplesmente porque não quis, mas sim porque é autônomo e está vivendo do seu trabalho e muitas vezes não tinha dinheiro para honrar o compromisso no dia, mas sempre se esforçou para honrar o compromisso, como de fato aconteceu, ainda que com alguns dias em atraso (Id 1085d39).
No caso, restou consignado que incidiria multa de 50% em caso de inadimplemento do acordo, incidente sobre o saldo remanescente (Ata de Id d250987).
Na hipótese destes autos, a pretensão do exequente em ver aplicada a multa não prospera, pois a penalidade se justificaria em caso de inadimplemento, o que, de fato, não ocorreu, já que, como dito, a execução foi quitada integralmente, embora com alguns dias de atraso em relação a cada parcela do acordo.
Registra-se que o objetivo da multa moratória é assegurar o ressarcimento dos prejuízos advindos do não cumprimento da obrigação, bem como pressionar o devedor recalcitrante a cumprir a condenação, e não o de ser aplicada indistintamente.
No presente caso, aflora-se os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade como meios a serem sopesados pelo magistrado, que deve privilegiar a boa conduta do executado em detrimento da penalidade.
Assim, entendo que a avença foi adimplida, o que não justifica a aplicação da penalidade nos moldes pretendido pelo exequente, devendo, no entanto, incidir juros e correção monetária sobre as parcelas pagas com atraso, como forma de compensar o exequente pelo atraso.
Registra-se que para o cálculo deverá ser observada a quantidade efetiva de dias atrasados em relação as datas do acordo de parcela e aplicados juros e correção neste período.
Encaminhem-se os autos à Contadoria para cumprir a determinação, devendo observar os recibos digitalizados pela secretária e juntados aos autos, comparando-o com as datas de vencimento fixadas no acordo (id d250987).
Após, notifique-se o executada para pagamento em 05 dias.
Cumpra-se.
O autor agrava de petição pretendendo a reforma da r. decisão que absolveu a executada do pagamento de multa prevista no termo de acordo homologado em Juízo para hipótese de atraso no pagamento das parcelas do referido ajuste.
Diz, em síntese, que a não aplicação da multa prevista em acordo homologado viola o art. 5º, XXXVI, da CF, devendo, portanto, ser observado, já que as parcelas do acordo foram pagas com atrasos que variaram de 1 a 8 dias, à exceção apenas da 12ª parcela, paga na data fixada no acordo.
Vejamos.
O exequente e o executado firmaram o acordo (Id d250987) nos autos, por meio do qual ficou ajustado que a empresa ré pagaria ao reclamante o valor de R$24.000,00, em 24 parcelas, por depósito nas datas fixadas no acordo. No caso de descumprimento, o executado pagaria multa de 50% sobre o saldo remanescente, assim como vencimento antecipado das parcelas vincendas.
Verifica-se que a ré atrasou o pagamento de 23 das 24 parcelas acordadas.
Por reiteradas vezes foi determinada a expedição de mandado de verificação com a intimação do executado para comprovar o depósito. Em todas as diligências, o executado comprovou ao Oficial de Justiça a efetivação do depósito da quantia devida ao reclamante na parcela perseguida, conforme se verifica dos autos.
De fato, o executado atrasou o pagamento do valor acordado com o reclamante em sucessivas parcelas, pois deveria ter providenciado o depósito das respectivas quantias em cada dia estabelecido no acordo como vencimento das parcelas.
Todavia, não há falar em inadimplência. Todas as parcelas foram quitadas, ainda que com atraso, que variaram de 1 a 8 dias. Assim, ainda que não observada a data do vencimento a rigor, o acordo foi quitado integralmente.
Ante o exposto, comungo da r. decisão de origem quanto à não aplicação da multa, bem ainda adequada a incidência de juros e correção monetária sobre in casu as parcelas pagas com atraso.
Diante do exposto, nego provimento.” (fls. 472/474)
O exequente, fls. 496/514, sustenta, em síntese, que
o atraso no pagamento das parcelas relativas ao acordo judicial acarreta, necessariamente, a aplicação da multa também prevista no referido instrumento, sob pena de ofensa à coisa julgada.
Indica violação do art. 5º, XXXVI, da Constituição e
traz arestos.
Ao exame.
Pois bem, a imutabilidade da coisa julgada material
é protegida pelo inciso XXXVI do art. 5° da CF.
Logo, uma vez proferida a decisão de mérito,
transitada em julgado, perfeita se torna a coisa julgada material, gozando o comando sentencial de plena eficácia, e inalterável pela via recursal, pois já se encontra esgotada.
Por sua vez, o artigo 879, § 1º, da CLT dispõe que, "Na liquidação, não se poderá modificar ou inovar, a sentença liquidanda, nem discutir matéria pertinente à causa principal".
In casu, constata-se, a partir do consignado no
acórdão recorrido, que "O exequente e o executado firmaram o acordo (Id d250987) nos autos, por meio do qual ficou ajustado que a empresa ré pagaria ao reclamante o valor de R$24.000,00, em 24 parcelas, por depósito nas datas fixadas no acordo. No caso de descumprimento, o executado pagaria multa de 50% sobre o saldo remanescente, assim como vencimento antecipado das parcelas vincendas. Verifica-se que a ré atrasou o pagamento de 23 das 24 parcelas acordadas.".
Não obstante isso, a Corte de origem concluiu que,
embora tenha ocorrido atraso no pagamento das parcelas, com períodos que variaram de 1 a 8 dias, o acordo foi quitado integralmente. Nessa linha, entendeu o Regional que não havia falar em aplicação da multa prevista no acordo.
Dessa forma, a conclusão adotada não se coaduna com
o comando extraído da decisão transitada em julgado, a qual versou expressamente sobre a aplicação da multa de 50% em caso de descumprimento do acordo.
Por conseguinte, o Regional, ao concluir indevida a
multa controvertida, violou a coisa julgada, haja vista que, conforme supramencionado, o título executivo judicial expressamente consignou a incidência da multa em caso de descumprimento do acordo, cabendo-se registrar que não se pode interpretar título judicial, mas apenas cumprir o respectivo comando.
Diante do exposto, conheço do recurso de revista por
ofensa ao art. 5º, XXXVI, da Constituição.
II – MÉRITO
Como consequência lógica do conhecimento do recurso
de revista por violação do art. 5°, XXXVI, da CF, dou-lhe provimento para reformar o acórdão regional e condenar os executados ao pagamento da multa de 50%, calculado sobre o valor das parcelas em atraso.
ISTO POSTO
ACORDAM os Ministros da Oitava Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do recurso de revista, por ofensa ao art. 5º, XXXVI, da Constituição, e, no mérito, dar-lhe provimento, para reformar o acórdão regional e condenar os executados ao pagamento da multa de 50%, calculado sobre o valor das parcelas em atraso.
Brasília, 10 de junho de 2020.
Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)
DORA MARIA DA COSTA
Ministra Relator