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DIREITO DESPORTIVO - JUIZ DO TRABALHO MARCOS ULHOA DANI

O Direito do Trabalho no Esporte é tema que exige muita dedicação de pesquisa, O Juiz do Trabalho Marcos Ulhoa Dani, da 10ª Região, tem se dedicado intensamente aos estudos do direito desportivo. Autor do livro “Tranferências e Registros de Atletas Profissionais de Futebol”, recentemente foi indicado como membro da Academia Nacional de Direito Desportivo (ANDD), cuja posse será realizada no Congresso Jurisports de Madrid, que acontecerá nos dia 10 e 11 de abril de 2017.

Nada melhor do que tirar dúvidas com quem entende do assunto; QUE CHUTA DE PRIMEIRA, SEM MATAR NO PEITO.

Rosarita Caron.

TUTELAS DE URGÊNCIA, HABEAS CORPUS E OUTRAS LIMINARES PARA RESCISÃO ANTECIPADA DE CONTRATOS DESPORTIVOS

  Marcos Ulhoa Dani – Juiz do Trabalho da 10a Região. Autor do livro “Transferências e Registros de Atletas Profissionais de Futebol – Responsabilidades e Direitos”.  

Um mercado futebolístico efervescente, com uma frequência quase semestral de grande número de transferências de atletas entre clubes, gera uma série de conflitos entre as partes deste contrato especial de trabalho desportivo. Um dos principais focos de disputa daquela relação de trabalho é a tentativa de rescisão antecipada do contrato de trabalho pelos atletas profissionais, seduzidos por propostas salariais mais tentadoras oriundas de outras agremiações desportivas, seja em âmbito nacional, seja em âmbito internacional. Passou a ser comum o ajuizamento de ações pelos atletas contra os clubes, normalmente acompanhados de pedidos incidentais de tutela de urgência, em que se pleiteia a rescisão indireta do contrato pela violação de deveres patronais. As alegações mais usuais dizem respeito a potenciais violações dos artigos 31, 34 (e incisos) e 39, §2o – este último no caso de empréstimo – da lei 9.615/98 (Lei Pelé). Ademais, há, ainda, pela aplicação do art. 28, §4o da mesma lei, a possibilidade de arguição de ocorrência de alguma das hipóteses das alíneas do art. 483 da CLT, haja vista que o contrato de trabalho desportivo não deixa de tratar de uma relação de emprego entre o atleta empregado e o clube empregador. A ruptura contratual por justa causa do empregador gerará, entre outros efeitos possíveis, o pagamento, pelo antigo empregador, da chamada cláusula compensatória desportiva em favor do atleta. Por outro lado, é preciso sopesar que os pleitos também podem revelar a ausência de causas ensejadoras da justa causa patronal, o que não afasta a liberdade de trabalho do atleta e a sua autonomia da vontade, caso em que poderá, ainda, pedir a rescisão unilateral. A situação, muitas vezes, pode ser dramática. Recentemente, ficou conhecido o caso do jogador francês Dimitri Payet. O atleta é empregado do clube inglês West Ham. Seu objetivo é voltar para o seu clube de origem, o Olympique de Marselha. Face à negativa do clube inglês em negociar seus direitos federativos pelo valor de 77 milhões de euros, o jogador fez uma declaração que mostrou sua agonia com a situação:

“Juro por tudo que é mais sagrado que nunca mais vestirei a camisa do West Ham. Se não me negociarem, eu mesmo machucarei meus joelhos. Sou um ser humano, tendo o direito de decidir meu futuro. E vejo meu futuro em Marselha”. (disponível em: http://extra.globo.com/esporte/decidido-sair-do-west-ham-payet-dispara-se-nao-me-venderem-eu-mesmo-machucarei-meus-joelhos-20789594.html#ixzz4Xo2W14mH – acesso em 05/02/17) A fugaz carreira de um atleta profissional de futebol, aliado ao rápido fechamento das chamadas “janelas de transferência internacional”, períodos do ano em que se permite a transferência e registro de atletas em âmbito internacional, vêm demandando instrumentos de resposta processual para estas demandas apresentadas perante a Justiça do Trabalho. Um dos artigos mais importantes do Novo Código de Processo Civil é, sem dúvida, o artigo 15 da nova lei adjetiva civil. Aquele artigo diz, em seus termos, que, na ausência de normas trabalhistas que regulem o Processo do Trabalho, os dispositivos do Novo Código aplicar-se-ão de modo subsidiário e supletivo às lides trabalhistas. Lado outro, o artigo 769 da CLT também permitiu que o intérprete se utilizasse da legislação processual comum, no caso de omissão da legislação processual trabalhista. No que tange a hipóteses de concessão de liminares de urgência, a legislação processual trabalhista foi deficiente e lacônica em relação a instrumentos processuais próprios para se garantir tutelas de ruptura antecipada em contratos de trabalho. Tal situação, leva, nos termos do artigo 769 da CLT e artigo 15 do CPC, à possibilidade de utilização da legislação processual comum e de outros remédios processuais no caso de tentativas de ruptura antecipada do contrato de trabalho desportivo. Na prática, a criatividade jurídica dos intérpretes da legislação tem trazido ao Judiciário pedidos de tutelas de urgência antecipada (art.300 e seguintes do CPC/15), tutelas de evidência (art.311), Habeas Corpus, Mandados de Segurança e Correições Parciais. Neste ponto, é preciso lembrar que, desde a extinção do chamado “Passe”, não se pode obrigar nenhum atleta a permanecer vinculado a um determinado clube contra a sua vontade. Entendimento contrário implicaria em ferir a liberdade de trabalho do atleta empregado e a sua autonomia da vontade. Ocorre que, na época do “Passe”, o jogador poderia continuar vinculado a um clube, mesmo após o fim da sua relação de emprego, e sem receber rendimentos. Atualmente, felizmente, esta situação não mais existe, pois o vínculo desportivo, agora, caminha “paripassu” com o vínculo trabalhista. Quando um vínculo cessa, o outro também cessa. Todavia, no caso especial do contrato de trabalho desportivo, é preciso se ter em mente que, para atuar por qualquer clube, o atleta necessita que o seu empregador seja detentor de 100% dos seus chamados “direitos federativos”, que, grosso modo, é o direito de registrar o atleta nas Ligas ou entidades/confederações/federações de organização do desporto para a atuação profissional nas competições oficiais. Como não pode ser registrado, concomitantemente, por duas agremiações desportivas, o clube empregador do atleta deverá ceder/vender os “direitos federativos” do atleta consensualmente, ou, o atleta deverá conseguir um provimento jurisdicional (ou arbitral perante os juízos arbitrais aptos) de urgência para tanto. Ou seja, na análise de um caso concreto, sempre há que se distinguir as consequências pecuniárias da ruptura de um contrato de trabalho desportivo e a liberdade de atuação do atleta empregado. Já nos manifestamos neste sentido:

“Em outras palavras, o atleta profissional de futebol, caso deseje romper o vínculo empregatício que tenha com determinado clube, durante a vigência do contrato desportivo de trabalho, poderá fazê-lo, arcando com as cominações pecuniárias correspondentes, no caso, a multa indenizatória desportiva.” (DANI, Marcos Ulhoa. Transferências e Registros de Atletas Profissionais de Futebol – Responsabilidades e Direitos. São Paulo: LTr, 2016, pg.64.)

No caso do contrato de trabalho desportivo, é preciso se ter em mente que um contrato padrão tem, nos termos da Lei Pelé (9.615/98), ao menos duas cláusulas obrigatórias, quais sejam: a cláusula indenizatória desportiva e a cláusula compensatória desportiva. A primeira prevê, nos termos do art. 28, I, a, da lei 9.615/98, a possibilidade de pagamento de indenização ao clube detentor definitivo dos direitos federativos do atleta no caso de transferências do atleta para outra entidade desportiva, durante a vigência do contrato de trabalho:

“I - cláusula indenizatória desportiva, devida exclusivamente à entidade de prática desportiva à qual está vinculado o atleta, nas seguintes hipóteses: (Incluído pela Lei nº 12.395, de 2011). a) transferência do atleta para outra entidade, nacional ou estrangeira, durante a vigência do contrato especial de trabalho desportivo”

Escolhida a via judicial (renúncia à via arbitral – art. 337, §6o, do NCPC), é necessário o sopesamento de direitos e de verossimilhança de alegações para o deferimento, ou não, da tutela pretendida, pois, a rigor, a parte reclamante alega descumprimentos contratuais do empregador que ensejariam a rescisão indireta do ajuste. Ou seja, nos parece que, na análise do deferimento, ou não, de tutela de urgência requerida em casos como os ora analisados, é preciso sopesar dois direitos conflitantes: o direito de liberdade de trabalho/autonomia da vontade do atleta e o direito da entidade desportiva empregadora, detentora definitiva dos direitos federativos do atleta, de receber a cláusula indenizatória desportiva no caso de ruptura antecipada do contrato de trabalho, com transferência do atleta para outra agremiação. Analisa-se cada uma das possibilidades de provimento jurisdicional aventadas. No caso de pedido de tutela de urgência incidental antecipada em uma ação trabalhista, em que o atleta empregado requer a sua liberação para atuação em outras agremiações, é preciso, nos termos do art. 300 do NCPC, analisar a probabilidade do direito e o perigo de dano ao atleta reclamante. Assim, se o atleta alega que o clube empregador, por exemplo, não está arcando com os depósitos de seu FGTS por 03 ou mais meses (art. 31, §2o da Lei Pelé), provando tal fato cabalmente via juntada de extratos fundiários atualizados que atestam tal ocorrência, nos parece que a tutela poderá ser concedida, sem restrições, devendo, com urgência, serem cientificados o atleta, seu atual empregador e as entidades de organização do desporto. No caso brasileiro, a entidade de organização do desporto é a CBF, que deverá ser intimada para, especificamente, providenciar o registro do atleta em outra agremiação de sua preferência (no caso de transferência nacional) ou fornecer os documentos e informações para a Federação Internacional (no caso de transferência internacional). De bom alvitre é também comunicar a decisão às Federações locais, para efeitos dos campeonatos regionais. Ou seja, no exemplo dado, provou-se, documentalmente, a verossimilhança das alegações de justa causa patronal e o perigo de dano, haja vista que o atleta não pode ficar trabalhando sem o recebimento dos valores devidos (contraprestação), sendo de se destacar que, no caso do FGTS, o numerário, dependendo da situação (por exemplo, aquisição de casa própria), poderá ser eventualmente sacado durante a contratualidade. Cabe lembrar que, na análise da concessão, ou não, da tutela de urgência, o juízo fará uma análise perfunctória das provas, em cognição sumária. Em outras palavras, a verossimilhança das alegações e a probabilidade do direito devem estar presentes em uma análise sumária, o que revela a necessidade, na maioria das vezes, que a prova seja documental e indene de dúvidas, permitindo ao juízo a formação de seu convencimento sem a necessidade de dilação probatória. Assim, se a pretensão esposada pela reclamação gera dúvidas ao magistrado quanto à verossimilhança das alegações, a tutela antecipada não deve ser concedida sem condições, haja vista a gravidade de suas consequências, pois, queira ou não, a rigor, o clube empregador faz uma série de investimentos para contar com os serviços do atleta, empenhando o futuro financeiro e de conquistas da agremiação na performance e atuação dos seus empregados contratados. É a chamada “Causa Mista” do Direito Desportivo do Trabalho, em que se sopesa a proteção ao trabalhador e a tutela do jogo. Por outro lado, sopesando o direito à liberdade de atuação do atleta, uma solução engenhosa dada por alguns precedentes recentes, é a concessão de tutela, com exigência de caução. A previsão é legalmente estabelecida no art. 300, §1o do NCPC. Diz o dispositivo legal:

“§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.“

Assim, mesmo não estando totalmente convencido da verossimilhança das alegações, o juiz pode conferir a tutela condicionada a uma caução real ou fidejussória. Por exemplo, se o atleta alega, em inicial, que não vem recebendo salários há mais de três meses na agremiação empregadora, sem qualquer prova documental neste sentido (por exemplo, extratos bancários que provem a ausência de depósitos na conta-salário), não se tem, em cognição sumária, sem a formação de contraditório, a verossimilhança de alegações provada. Neste caso, calcado na probabilidade do direito à livre atuação, o juiz condutor do processo pode, não sendo obrigado, exigir caução para o deferimento da tutela de urgência. Em outras palavras, o juiz pode conceder a tutela de forma condicionada, ou seja, somente poderá ter a liberdade de atuação o atleta que, por exemplo, depositar em juízo o valor da cláusula indenizatória desportiva em favor do clube empregador acionado, garantindo-se a indenização da entidade desportiva caso não se verifiquem, “a posteriori”, as alegações da inicial. Chama-se a atenção para o contrato de cessão temporária de atletas profissionais (o popular “empréstimo”). No caso, o clube cessionário é detentor temporário dos direitos federativos do atleta. A situação tem regramento específico na Lei Pelé, qual seja, o art. 39 e §§1o e 2o do mesmo dispositivo legal. Na situação em análise, em regra, o clube cessionário é responsável por todos os pagamentos ao atleta; Por se tratar de um contrato mais curto do que o contrato com o clube cedente, se o clube cessionário atrasar o pagamento do salário, contribuições ou outros valores devidos ao atleta, por apenas 2 meses, será necessário que o atleta notifique a entidade desportiva cedente para, em 15 dias, purgar a mora do clube cessionário. Não o fazendo o clube cedente, o atleta poderá entrar com uma ação para rescindir o contrato de cessão temporária com o clube cessionário, receber as verbas devidas, inclusive a cláusula compensatória desportiva. Ocorre, entretanto, um erro comum nestas demandas. Não raro, a parte reclamante, no caso o atleta cedido, ajuíza ação contra o clube cessionário, empregador temporário, com pedido de tutela de urgência para se transferir para qualquer clube de sua preferência. Entretanto, nos termos explícitos do §2o, do art. 39 da CLT, ocorrendo a rescisão indireta com o clube cessionário, o atleta deverá retornar à entidade de prática desportiva cedente para cumprir o restante do seu antigo contrato de trabalho desportivo original. Assim, o juiz sentenciante não pode deferir tutela de urgência antecipada liberando o atleta para atuar por toda e qualquer equipe, pois a ação tem o fim único de rescindir o contrato com a equipe cessionária e não com a equipe cedente, a não ser em caso de fraude e conluio entre equipes cessionária e cedente, situação que deve vir explícita em petição inicial, sobretudo com a inclusão, no polo passivo, de ambas as equipes. Não concedida a tutela antecipada incidental, ou concedida de forma condicionada, a decisão não é atacável de plano para um órgão jurisdicional revisor, nos termos do art. 893, §1o, da CLT (o que não impede o pedido de reconsideração direcionado ao próprio juiz prolator da decisão). Somente no caso de sentença definitiva desfavorável é que a parte reclamante poderá, juntamente com o recurso ordinário direcionado ao TRT, requerer novamente a tutela antecipada, agora ao órgão revisor, o TRT. Todavia, tem-se observado, em vista das eventuais negativas do primeiro grau de jurisdição em sede de cognição sumária, a parte pleiteante usar de outros expedientes processuais criativos para obter posicionamento jurisdicional favorável. Um destes expedientes é a impetração de Mandado de Segurança contra o indeferimento de tutela antecipada. O remédio é ajuizado perante o órgão revisor imediato, qual seja, o TRT, requerendo a revisão da ausência de concessão da tutela em primeiro grau de jurisdição. O procedimento, a nosso sentir, é vedado pela Súmula 418 do TST que diz, “in verbis”:

Súmula nº 418 do TST MANDADO DE SEGURANÇA VISANDO À CONCESSÃO DE LIMINAR OU HOMOLOGAÇÃO DE ACORDO (conversão das Orientações Jurisprudenciais nºs 120 e 141 da SBDI-2) - Res. 137/2005, DJ 22, 23 e 24.08.2005 A concessão de liminar ou a homologação de acordo constituem faculdade do juiz, inexistindo direito líquido e certo tutelável pela via do mandado de segurança. (ex-Ojs da SBDI-2 nºs 120 - DJ 11.08.2003 - e 141 - DJ 04.05.2004)

No caso, a concessão, ou não, da liminar, é faculdade do juiz, haja vista a independência de cada órgão da jurisdição. A decisão não atacável, a nosso sentir, via mandado de segurança que, para a sua concessão, demanda a exigência de direito líquido e certo, aferível de plano. O entendimento jurisdicional motivado é protegido pela independência de cada órgão do Poder Judiciário, adstrito que está ao Poder Geral de Cautela. Ora, diante de dúvidas quanto à concessão de tutela e o seu posterior indeferimento, não se vislumbra direito líquido e certo em sede de MS, afastando-se os requisitos para a concessão da segurança. No dizer de HELY LOPES MEIRELLES, "direito líquido e certo é o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e apto a ser exercitado no momento da impetração" (in Mandado de Segurança, 14ªedição, pág. 25). Outro instrumento utilizado é o “Habeas Corpus”, resultado da posição pioneira do Exmo. Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, no histórico HC 3981-95.2012.5.00.0000, em que foi pleiteada a liberdade de trabalho do jogador Oscar dos Santos Emboaba Júnior perante o São Paulo Futebol Clube, em face de decisão turmária do TRT da 2a Região. No caso, observou-se, mais uma vez, a probabilidade do direito vindicado. Com a ampliação da competência material da Justiça do Trabalho, feita pela Emenda Constitucional, 45/2004, possibilitou-se a interpretação pela possibilidade de utilização do “Habeas Corpus” na Justiça Especializada. Assim, a partir da pioneira posição do Exmo. Ministro Guilherme, o “habeas corpus” pode de ser estendido para abarcar a ilegalidade ou abuso de poder praticado em face de uma relação de trabalho. Assegurou-se a utilização de tal ação constitucional com vistas à proteção da autonomia da vontade contra ilegalidade ou abuso de poder perpetrado, seja pela autoridade judiciária, seja pelas partes da relação de trabalho. Naquele caso em concreto, a liminar deferida estabeleceu a particularidade específica do “Habeas Corpus” para o contrato de trabalho desportivo. O HC distribuído perante o TST desconstituiu liminarmente decisão proferida pela 16a Turma do TRT da 2a Região. Segundo a liminar, mesmo contra a vontade do jogador, a decisão afastou o pedido de rescisão indireta e mandou reestabelecer o vínculo desportivo entre São Paulo Futebol Clube e o atleta, sendo que o vínculo desportivo é acessório ao contrato de emprego. No caso, portanto, mesmo contra a vontade do atleta, deu-se pelo reestabelecimento do vínculo desportivo, quando o atleta já não demonstrava o intuito de permanecer vinculado ao clube empregador, o que geraria, portanto, outras consequências, qual seja, o pedido de demissão. Perceba-se a sutileza da possibilidade de deferimento da medida. No particular, fica claro que a liminar deferida não adentrou às consequências pecuniárias do eventual desfazimento do vínculo de emprego. Quedou-se, simplesmente, na potencial ilegalidade de decisão que negou liberdade de trabalho e autonomia da vontade do jogador, quando, em nossa visão, a parte impetrante requeria a cessação do vínculo originário, de uma maneira ou de outra (seja por rescisão indireta, seja pelo pedido de demissão), nos termos, inclusive do art. 483, §3o, parte final, da CLT. A nosso sentir, a hipótese do HC na Justiça do Trabalho é possível nestes casos, todavia, respeitadas as doutas posições em contrário, é difícil a sua ocorrência e o seu provimento. É efetivamente raro uma ação em que o trabalhador atleta deseje a cessação do vínculo por pedido de demissão (seja como pedido principal, seja como pedido sucessivo), pois, neste caso, poderia utilizar as vias normais, pagando a cláusula indenizatória desportiva em favor do clube empregador para atuação em outra agremiação. É mais usual o ajuizamento de pedido de rescisão indireta, afastando-se a cláusula indenizatória desportiva, com consequentes requerimentos de pagamentos de uma rescisão por culpa do empregador, inclusive com o adimplemento da cláusula compensatória desportiva em favor do atleta. É raro um pedido sucessivo de demissão, haja vista as graves consequências financeiras ao atleta caso, efetivamente, se transfira para outro clube (o que não ocorrerá, por exemplo, se o atleta se aposentar). Agora, respeitadas as posições em contrário, não nos parece ser possível o deferimento liminar de HC quando, claramente, o atleta não deseja o pedido de rescisão unilateral por sua iniciativa e deseja deixar o clube empregador sem custos pessoais, por alegada culpa do empregador. Tal situação se densifica se o clube empregador estiver em dia com as suas contraprestações contratuais. Tampouco nos parece possível o ataque, via HC, de decisão de 1a ou 2a instância que simplesmente nega o pedido de rescisão indireta, pois, na nossa visão, o “Habeas Corpus” não pode fazer o papel de sucedâneo de recurso, uma vez que a legislação processual é pródiga em possibilidades recursais. Incide o Princípio da Unirrecorribilidade das decisões judiciais, pois, caso contrário, estar-se-ia diante de um potencial e teratológico cenário de supressão de instâncias, com a possível impetração de um “Habeas Corpus” sobre outro “Habeas Corpus”, o que se chocaria, em potência, com as previsões de litispendência ou coisa julgada, nos termos do art. 337, §§1o, 2o e 3o do CPC. A existência de um novo “Habeas Corpus” contra uma eventual decisão denegatória de um primeiro “Habeas Corpus”, mesmo que sob fundamento diverso, não altera a causa de pedir principal. Não há que se confundir fundamento legal com causa de pedir, como observado no Novo Código de Processo Civil anotado dos autores Theotonio Negrão, José Roberto F. Gouvêa; Luis Guilherme A. Bondioli e João Francisco N. da Fonseca, em sua 47a Edição Atualizada e Reformada, em 2016, na fl. 542, ao transcreverem o seguinte julgado do STJ:

“A diversidade de fundamento legal invocado pelas partes ou a alteração na qualificação jurídica dos fatos narrados não são determinantes para afastar a identidade entre as ações. Tais fatores não integram a causa de pedir, nem vinculam o magistrado, por força dos princípios iura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus. A nossa legislação processual adotou a teoria da substanciação, segundo a qual são os fatos narrados na petição inicial que delimitam a causa de pedir. Concretamente, da leitura dos autos, extrai-se que, em ambas as ações, foi relatado o mesmo fato, qual seja a celebração de negócio jurídico entre o ex-sócio gerente da massa falida e a primeira ré, durante o período suspeito da falência, em prejuízo ao patrimônio da massa falida. Também constata-se que, em ambos os casos, buscou-se a mesma consequência jurídica: o reconhecimento da nulidade/ineficácia do referido negócio. Nesse contexto, era defeso à parte, que não obteve êxito na primeira demanda, renovar a pretensão, narrando os mesmos fatos e visando às mesmas consequências, apenas sob diferente qualificação jurídica (dação em pagamento) e indicação mais precisa dos dispositivos legais (art. 52, inciso II e 53 do Decreto-lei 7.666/45).” (REsp 1009057/SP, Rel. Ministro VASCO DELLA GIUSTINA (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJ/RS), TERCEIRA TURMA, julgado em 27/04/2010, DJe 17/05/2010)

Ou seja, mais um argumento da parte impetrante não modifica a causa de pedir das duas ações idênticas. A causa de pedir, pela Teoria da Substanciação vigente em nosso Ordenamento, diz respeito aos fatos das demandas. Os fatos, nas duas ações, são os mesmos. A diversidade de fundamento legal invocado pelas partes ou a alteração na qualificação jurídica dos fatos narrados não são determinantes para afastar a identidade entre as ações. Tais fatores não integram ou modificam a causa de pedir, nem vinculam o magistrado, por força dos princípios iura novit curia e da mihi factum, dabo tibi jus. Frise-se que a coisa julgada abarca todas as potenciais alegações da parte. Em caso de “Habeas Corpus” sucessivos, tem perfeita aplicação ao caso, o disposto no art. 508 do CPC, qual seja, passado em julgado a sentença de mérito, consideram-se deduzidas e repelidas todas as alegações que a parte poderia fazer e não as fez no processo, valendo referidos dispositivos para novos argumentos em outra demanda, conforme escólio magistral de Nelson Nery Júnior:

“Transitada em julgado a sentença de mérito, as partes ficam impossibilitadas de alegar qualquer outra questão relacionada com a lide, sobre a qual pesa a autoridade da coisa julgada. A norma reputa repelidas todas as alegações que as partes poderiam ter feito na petição inicial e contestação a respeito da lide e não fizeram (alegações deduzidas e dedutíveis – cf. Barbosa Moreira. A eficácia preclusiva da coisa julgada material no sistema do processo civil brasileiro [Temas¹ p. 100]). Isto quer significar que não se admite a propositura de nova demanda para rediscutir a lide, com base em novas alegações. A este fenômeno dá-se o nome de eficácia preclusiva da coisa julgada.” (In Código de Processo Civil Anotado, 13ª edição. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2013). (Destaquei).

É preciso lembrar que o HC pressupõe patente ilegalidade do ato atacado ou abuso de poder da autoridade impetrada, o que não nos parece ser o caso em situações de decisões judiciais motivadas dentro dos limites da lide. O remédio constitucional depende de prova pré-constituída, não comporta dilação probatória e seus fundamentos devem vir demonstrados de plano, em seu ajuizamento. Em nossa ótica, a possibilidade de deferimento de um “Habeas Corpus” pressupõe o impedimento do autor exercer a sua vontade de deixar o clube, por exemplo, quando requer uma demissão, ou quando fica patente a hipótese de rescisão indireta. Não há que se confundir tais situações com o caso em que não é conveniente ao atleta pedir demissão, por questões financeiras, não havendo prova inequívoca de caso de rescisão indireta do contrato. Um outro instrumento processual que vem sendo utilizado é o das correições parciais, também denominado reclamação correicional. A conceituação do instituto é dada por Sérgio Pinto Martins:

“A correição parcial é o remédio processual destinado a provocar a intervenção de uma autoridade judiciária superior em dace de atos tumultuários de procedimento praticados no processo por autoridade judiciária inferior. Ato tumultuário da boa ordem processual é o que não observa as regras legais previstas para o processo...” (MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e Prática Forense; Modelos de Petições, Recursos, Sentenças e Outros. 24a. Edição; São Paulo: Atlas, 2005, p. 471, apud in DANI, Marcos Ulhoa. Direito Processual do Trabalho – Teoria e Práticas Modernas.Rio de Janeiro. Forense. 2012, p. 270.

Ou seja, o remédio é para corrigir erros, abusos e atos contrários à boa ordem processual, quando não haja recurso ou outro meio processual específico. Nos parece, neste caso, que a possibilidade de utilização destes instrumentos é bastante restrita. As Correições Parciais são procedimentos utilizados para se atacar, em regra, erros de procedimento das autoridades judiciais, e não para se atacar erros de julgamento; eventual “error in judicando” só poderá, em regra, ser atacado via recurso próprio. Na Justiça do Trabalho, a Corregedoria Regional poderá analisar atos de juízes de primeiro grau e a Corregedoria Geral no TST poderá analisar atos de desembargadores dos TRT´s. No caso específico dos contratos desportivos, este instrumento poderá ter consequências na matéria de fundo somente de modo indireto, sem que isto represente extrapolação da competência de cada Corregedoria. Tem sido o caso, por exemplo, de demora excessiva e sem justificativa de juízo de admissibilidade de recurso de revista, adentrando-se, inclusive, o período de recesso forense. Já ocorreram casos em que houve correição parcial ao TST neste sentido, requerendo-se o provimento jurisdicional de fundo, pois o processo estaria em demora excessiva e, antes da decisão de admissibilidade de revista, o TST não poderia analisar eventual pedido de tutela de urgência trazida no corpo do recurso principal, por falta de competência para tanto. Neste caso, o Corregedor Geral do TST, ou quem lhe fizesse as vezes em substituição, poderia, calcado nos mesmos requisitos de probabilidade do direito, verossimilhança de alegações e perigo na demora, analisar pedido liminar de liberação de atuação do atleta por outra agremiação, em caráter incidental. Novamente, lembra-se, o juízo, neste caso, é de cognição sumária, e não exauriente, demandando, portanto, uma constatação inequívoca e patente de violação do direito para eventual provimento. Finalmente, chegamos ao instrumento processual de tutela de evidência, que, diferentemente das tutelas de urgência antecipadas (que podem ser antecedentes ou incidentais), só podem ser analisadas em caráter incidental, preferencialmente após a formação do contraditório (incisos I e IV, e parágrafo único, do art. 311 do CPC). As hipóteses legais são autoexplicativas, sendo que, no caso, não haverá a necessidade de demonstração de perigo de dano para o eventual provimento de urgência. A tutela poderá ser concedida no caso, por exemplo, de manifesto propósito protelatório da parte contrária e abuso de direito de defesa, bem como se a petição inicial foi instruída com prova documental suficiente dos fatos constitutivos do direito do autor, a que o réu não oponha prova capaz de gerar dúvida razoável. No caso das tutelas de urgência, acreditamos, nos termos dos arts. 139, IV e 536 do CPC, que a tutela também pode ser deferida, inclusive, de ofício. Como se vê, o deferimento de liminares na Justiça do Trabalho, nestes casos, geram consequências importantes nos contratos de trabalho dos atletas, tanto para estes como para as agremiações empregadoras, sendo de se destacar o cuidado em tais análises, pois, de acordo com as hipóteses do art. 302 do CPC, independentemente da reparação do dano processual, a parte responde pelo prejuízo que a efetivação da eventual tutela de urgência concedida causa à parte adversa se, por exemplo, a sentença for desfavorável ao autor. Enfim, percebe-se que os eventuais deferimentos das liminares apresentadas, em muito, passam pela análise dos pedidos iniciais, das provas documentais que os acompanham, bem como pela probabilidade de provimento final, evitando-se, assim, potenciais prejuízos processuais e materiais futuros para as partes envolvidas.

COLUNA JUÍZO DE VALOR - SITE JOTA - UMA REFORMA IMPREVIDENTE - GUILHERME FELCIANO

JUÍZO DE VALOR -  JOTA - 

http://jota.info/colunas/juizo-de-valor/uma-reforma-imprevidente-03022017

Uma reforma imprevidente

E a sociedade civil? Reagirá de algum modo? Ou engolirá placidamente o batráquio?

 03 de Fevereiro de 2017

Estamos todos à volta com a Proposta de Emenda Constitucional n. 287/2016, que pretende “reformar” – pela terceira vez em pouco menos de vinte anos – a Previdência Social no Brasil, tanto para o setor público como para o setor privado. O Governo Federal e a Confederação Nacional da Indústria inundam todas as mídias – desde as paredes dos grandes aeroportos até o horário nobre das principais redes de televisão do país – com a cantilena das necessidades e das bondades da Reforma.

Quando o brilho de uma estrela é tão intenso, vale conferir se não se trata de um reles satélite a circundar a nossa órbita. Nesse caso, um grande e pesado satélite, prestes a se precipitar sobre as nossas cabeças. Vejamos.

A PEC n. 287/2016 consubstancia, repito, a terceira grande reforma previdenciária encaminhada pelo Governo Federal, sob os mais diversos matizes partidários, desde 1998. Sob Fernando Henrique Cardoso (PSDB), tivemos a EC n. 20/1998. Sob Luís Inácio Lula da Silva (PT), tivemos a EC n. 41/2013 (e também a EC n. 43/2015, oriunda da chamada “PEC paralela”, que melhorou razoavelmente a condição dos servidores públicos atingidos pela EC n. 41).

Por fim, sob Michel Temer (PMDB), poderemos ter, dentre todas, a mais radical das reformas previdenciárias pós-redemocratização, sob o manto da PEC n. 287. Outra vez, propõe-se restringir a proteção previdenciária e assistencial que socorre a sociedade civil – agora, porém, mais agressivamente −, aumentar a arrecadação correspondente – nisto, porém, com medidas pífias − e culpabilizar o Estado social pelo quadro de deterioração econômico-financeira que acomete o país, muito menos por conta dos benefícios e serviços prestados pela Previdência Social e muito mais em função de fatores convenientemente esquecidos, como:

(a) as incontáveis isenções, renúncias,desvinculações e remissões fiscais em matéria de custeio previdenciário, como outrora se deu, e.g., com a MP n. 651/2014, depois Lei n. 13.043/2014, ainda sob Dilma Roussef; ou há alguns poucos meses, com a EC n. 93/2016, já sob Temer, aumentando para 30% a margem da DRU (Desvinculação das Receitas da União), o que significa liberar, para outros usos, praticamente um terço de toda a  “arrecadação da União relativa às contribuições sociais” (art.  76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias) – e “sem prejuízo do pagamento das depesesas do Regime Geral da Previdência Social” (?), o que seria um milagre. Ora, como pode o Governo Federal exigir da população que aperte tão severamente os cintos, alegando a insuficiência de recursos para o orçamento da Previdência Social, se ele próprio, Governo Federal, patrocina um aumento da sua margem de manobra para aplicar em fins diversos as receitas da Seguridade Social?

(b) os nossos monstruosos índices de sonegação fiscal-previdenciária (calculam-se cerca de 900 bilhões de reais acumulados de perdas nesse quesito, devidos por menos de 13 mil pessoas físicas e jurídicas), valendo lembrar que a famigerada EC n. 95/2016 – a do “teto dos gastos públicos” −, que praticamente engessou quaisquer investimentos adicionais em saúde, educação ou segurança pública nos próximos vinte nos (e acerca da qual já pende ação dreta de inconstitucionalidade, a saber, a ADI n. 5633/DF, ajuizada pela ANAMATRA, pela AJUFE e pela AMB, e distribuída à Min.ª Rosa Weber), baseou-se na constatação de que, para este ano de 2017, haveria um déficit de “apenas” 140 bilhões de reais;

(c) o sempre providencial oblívio das fontes extras de receitas para a Seguridade Social que a própria Constituição anteviu ou ensejou (por exemplo, no art. 7º, XXVII, da CF, ao dispor sobre a proteção social dos trabalhadores urbanos e rurais em face da automação, na forma da lei  − que nunca veio −, ou no art. 239, §4º, da CF, ao dispor sobre a “contribuição adicional da empresa cujo índice de rotatividade da força de trabalho superar o índice médio da rotatividade do setor, na forma estabelecida em lei” – que tampouco veio −; ou ainda, para sair do campo previdenciário, a injustificável isenção dos dividendos que se distribuem a sócios e acionistas no Brasil, independentemente do montante, enquanto qualquer cidadão cujo salário supere a R$ 1.903,98 terá de recolher IRPF.

É, ademais, curiosa – para não dizer cruel − a insistência do establishment em reformas desta natureza. Esse mesmo receituário já foi aplicado, sem sucesso, nas reformas anteriores. Mais uma vez, fará pouco mais que incrementar as taxas nacionais de empobrecimento populacional e precarizar carreiras públicas e de Estado. E o suposto déficit da Previdência Social seguirá se agravando.

Suposto?

Essa é uma longa discussão. O fato é que não há unanimidade quanto à tese de que o nosso atual modelo previdenciário seja irremediavelmente deficitário. Ao revés, há estudos importantes revelando que, no ano de 2015, o somatório das renúncias fiscais, desonerações e desvinculações de receitas patrocinadas pelos próprios poderes constituídos correspondeu a aproximadamente 50% do alegado déficit, sendo certo que, nos últimos anos, o total de renúncias previdenciárias chegou ao impressionante valor de R$ 145,1 bilhões. Não bastasse, esse quadro é agravado, como visto acima, pela ineficiência na realização da dívida ativa previdenciária; essa realização representou, em 2015, não mais que 0,32% da dívida executável (R$ 1,1 bilhão arrecadado, contra um estoque de R$ 350 bilhões). Ademais, e mais importante, a própria conta que o governo federal realiza seria historicamente equivocada. É que, pelo modelo constitucional de Seguridade Social (art. 203/CF), haveria que se acrescer, nas entradas, os recursos arrecadados com as receitas sobre prognósticos (loterias), a COFINS, a CSLL e o PIS/PASEP. Nesse orçamento único (art. 165, §5º, III, CF), apenas em 2014 o superávit seria de R$ 53 bilhões de reais. O Governo considera, no entanto, apenas as receitas do artigo 195, I, “a” (contribuições do empregador, empresa e entidade equiparada sobre a folha de salários e demais rendimentos do trabalho pagos ou creditados, a qualquer título, a pessoa física) e do artigo 195, II (contribuições do trabalhador e demais segurados da previdência social), ambos da Constituição. Noutras palavras, para calcular o seu déficit, calcula basicamente o que integra o fundo do art. 205/CF, e não todas as entradas constitucionalmente destinadas à Seguridade Social. E, no Brasil, o sistema é uno, de seguridade social, envolvendo previdência social, assistência social e saúde. E não somente de previdência.

É verdade, e releva dizer, que, mesmo nesse cálculo mais “panorâmico”, a envolver todas as receitas e despesas próprias da Seguridade Social − como quis o constituinte originário −, o superávit vem caindo. Mesmo por essa via, portanto, teremos provavelmente de acusar défices nos próximos anos. Mas, por essa perspectiva, o quadro é bem mais ameno que aquele pintado pela propaganda oficial; hoje, ainda teríamos superávit. E, por consequência, o remédio não precisaria ser tão amargo. Como, de fato, não precisa. Nem de direito.

E o amargor da PEC n. 287/2016 vem forte, à primeira leitura. Vem a cavalo.

Desconhece-se a condição especial da mulher no mercado de trabalho, igualando a idade mínima para aposentadoria em 65 anos, entre homens e mulheres. Ora, os dados do IDG-PNUD (Índice de Desiguladade de Gênero do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) ainda demonstravam, para o Brasil dos últimos anos, haver ainda uma profunda desigualdade de gênero no Brasil, com reflexos inegáveis sobre o mercado de trabalho; e, a par disso, é ainda da “cultura” machista brasileira a ideia da “mulher-mantenedora” (e do “homem-provedor”), restando-lhe amiúde os serviços domésticos e uma recorrente dupla – ou tripla – jornada. Reduzir drasticamente o valor das pensões, já restringidas por ocasião da EC n. 41/2003, inadmitindo a acumulação com aposentadorias.

Criam-se condições draconianas para que o cidadão possa obter a melhor condição previdenciária. Assim, por exemplo, exige-se que, para receber proventos de aposentadoria no valor máximo (“teto”) aos 65 anos, os segurados comecem a trabalhar aos 16 anos (para contribuir por 49 anos). Essa medida é uma flagrante política de despriorização da educação e de desmobilização de jovens e adolescentes regularmente matriculados nas escolas, especialmente no campo. E, não por outra razão, já há quem apelide essa PEC n. 287/2016 de “PEC do caixão”.

Altera-se a base de cálculo dos benefícios para considerar toda a vida contributiva do segurado (inclusive a porção equivalente a 20% das menores contribuições, que hoje são descartadas no cálculo). Com isso, reduz-se o valor médio dos benefícios, até mesmo para quem já está integrado ao Regime Geral de Previdência Social e aos vários Regimes Próprios de Previdência Social (serviço público), com impactos econômicos relevantes para o país, especialmente nos municípios de pequeno porte, cuja economia não raro se alimenta com a demanda gerada por tais benefícios. O mesmo se diga das reduções que a PEC n. 287/2016 imporá às pensões por morte, como à própria proibição de que se acumulem aposentadorias e pensões, conquanto muitos servidores públicos paguem por ambas as coisas (e, então, estaremos falando em genuíno confisco). São, a rigor, medidas recessivas.

Especificamente em relação aos Regimes Próprios de Previdência Social, todos aqueles que até agora anda têm assegurados a paridade e a integralidade dos vencimentos ao tempo da aposentadoria perderão essa garantia, da noite para o dia, desde que não contem, ao tempo da promulgação da PEC n. 287/2016, com 45/50 anos (se mulher/homem) ou mais. E mesmo em relação aos servidores que já não têm tais garantias, integrando-se ao novo regime implementado com a Lei n. 12.618/2012 (das FUNPRESPs), haverá potenciais prejuízos, na medida em que esses fundos perdem o seu caráter público com o texto proposto. Caminhamos para a privatização previdenciária chilena. E se desfere um duríssimo golpe no princípio da confiança, jogando pá-de-cal sobre todos os acordos de transição encetados pelos governos anteriores (ECs ns. 20/1998, 41/2003 e 47/2005). Mais que isso, agride-se a própria isonomia, princípio basilar da Constituição da República (art. 5º, caput, CF), porque indivíduos com o mesmo tempo de contribuição e com o mesmo tempo de exercício efetivo no serviço público, no mesmo cargo e na mesma função, terão tratamentos diversos, apenas porque têm idades diferentes.

São, para mais, inúmeras as evidências de que a PEC n. 287/2016 promoverá patente retrocesso social, sem qualquer contrapartida, a despeito dos compromissos assumidos pelo Brasil perante a comunidade internacional (art. 26 da Convenção Americana de Direitos Humanos).

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E a sociedade civil? Reagirá de algum modo? Ou engolirá placidamente o batráquio?

No dia 02/02, de algarismos quase cabalísticos, ouviu-se a primeira grita pública organizada. Uma contundente nota contrária a essa “nova” Reforma da Previdência foi publicada pelas mais destacadas entidades representativas das carreiras públicas do país, como a AMB (Associação dos Magistrados Brasileiros), a ANAMATRA (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), a ANFIP (Associação Nacional dos Auditores Fiscais da Fazenda Nacional), a CONAMP (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público), a ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), a ANPT (Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho) e a ANMPM (Associação Nacional dos Membros do Ministério Público Militar), além de importantes organizações da sociedade civil, como a ATUAS (Associação Nacional dos Atuários) e a Auditoria Cidadã da Dívida. Ao mesmo tempo, preparam dia de protesto para o dia 15/2.

Também nesta semana, a Ordem dos Advogados do Brasil, reunida na sede do seu Conselho Federal com diversas entidades da sociedade civil organizada,  elaborou uma nota pública a propósito da PEC n. 287/2016, acidamente crítica. Não é preciso lembrar o papel histórico da OAB na defesa das liberdades públicas.

E, no mesmo encalço – para ficarmos por aqui −, as principais centrais sindicais de trabalhadores preparam não apenas a publicação de um manifesto de repúdio à PEC n. 287/2016, mas um dia nacional de paralisação, à maneira das “greves gerais”, para protestar contra a malsinada reforma.

Diante desse quadro de múltiplas insurgências, querido leitor, a pergunta que remanesce é: estamos todos errados?

Se estivermos, a História nos julgará. Ou ao menos nos reservará um “pito”.

Se não estivermos, julgados serão os “heróis” dessa kafkiana reforma que, para − supostamente − preservar uma edificação em vias de ruir ante o peso demasiado do que se construiu,  passa a deitar fora o telhado e demolir os muros dos cômodos. Ao final, sim, restará a edificação, ou o seu esqueleto, de pé. Mas o seu interior será praticamente inabitável. E os seus alicerces, no final das contas, continuarão incapazes de suportar maior peso. More-se em outros sítios, ora bolas.

Razoabilidade não é uma virtude desses tempos líquidos (valendo a menção como nossa singela homenagem ao grande Zigmund Bauman, morto no último dia 09/01). Mas pertinácia talvez seja.

É da mitologia grega, na ordem proposta por Pseudo-Apolodoro (nome hoje dado ao autor da Biblioteca, que no século I ou II d.C. reuniu diversos narrativas mitológicas esparsas), que, no seu terceiro trabalho, Hércules alcançou e dominou a corça de cerínia, animal lendário dotado de chifres de ouro, pés de bronze e capaz de correr em incríveis velocidades, sem jamais se exaurir. Narra a lenda que Hércules a perseguiu por um ano inteiro, até finalmente a fatigar; então, alvejou-a com uma flecha, ferindo-a levamente, pois deveria levá-la viva a Eristeus.

Será assim, caro leitor, com a Reforma da Previdência. A propaganda do Governo apresenta-a reluzente e bela, qual ouro, portadora de todas as esperanças para as futuras gerações. Seus fundamentos e razões, porém, são bem menos valiosas do que se divulga ser. Seria mesmo melhor dizer que seus pés não são de bronze; são, talvez, de barro, qual o gigante sonhado por Nabucodonosor, rei da Babilônia. Por outro lado,  a PEC n. 287/2016, em uma Câmara presidida por Rodrigo Maia (DEM-RJ), possivelmente “correrá” com velocidade simbolicamente superior à de qualquer corsa, real ou mítica. Sem maior diálogo ou reflexão, embora ainda penda, no Tribunal de Contas da União, relatório final sobre a real situação das contas da Previdência Social no país (como determinado, em 16/01., pelo Ministro Raimundo Carreiro, atual Presidente do TCU). Não seria, nos lindes do razoável, o caso de aguardar?…

Dirão que não. “O país tem pressa”.

Aos que discordam desse modelo de previdência mínima – quase imprevidente −, restará a tenacidade. Perseverar na difícil tentativa de conter a “corsa” em sua carreira desabalada. À maneira de Hércules… Mas ouvindo, de todos os cantos da rosa-dos-ventos, acusações de obscurantismo.

O que assusta mesmo, amigo leitor − muito mais que a corça de cerínia, o gigante de Nabucodonosor ou o bicho-papão −, é perceber que, nos dias correntes, fala-se muito de “futuro”, mas se olha mesmo é para o retrovisor. Bem, já falamos disto aqui.

******** Que tal a coluna? Há algum tema do Direito, da Política ou da Economia que pareça merecer um olhar “diferente”? Sugira-nos. O e-mail está abaixo. Na quinzena que vem: ativismo judicial. Que bicho é este? Domestica-se? Guilherme Guimarães Feliciano - Juiz titular da 1ª Vara do Trabalho de Taubaté, é professor associado II do Departamento de Direito do Trabalho e da Seguridade Social da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Doutor em Direito Penal pela USP e em Direito Processual Civil pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Livre-docente em Direito do Trabalho pela USP, Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

JUIZ DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO, RUBENS CURADO, DETERMINA PUBLICAÇÃO DE "LISTA SUJA" DO TRABALHO ESCRAVO

O site do ESTADÃO publicou hoje notícia sobre decisão do Juiz do Trabalho Rubens Curado, da 10ª Região, que determinou à União e ao Ministro de Estado do Trabalho a publicação do Cadastro de Empregadores flagrados com trabalhadores em condições análogas a de escravo.

Esta lista é de suma importância para o combate ao trabalho escravo.

Confira a matéria e a sentença publicadas.

site: http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/justica-manda-governo-publicar-lista-suja-do-trabalho-escravo/

"Justiça manda governo publicar ‘lista suja’ do trabalho escravo

   

Decisão do juiz Rubens Curado, da 11.ª Vara do Trabalho de Brasília, mantém liminar que impõe publicação em até 30 dias do Cadastro de Empregadores flagrados

  Foto: Reprodução Mateus Coutinho e Fausto Macedo  

O juiz Rubens Curado Silveira, da 11.ª Vara do Trabalho de Brasília, manteve nesta segunda-feira, 30, a liminar que obriga o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, e a União a publicar em até 30 dias o Cadastro de Empregadores flagrados com mão de obra análoga à de escravo, conhecido como ‘lista suja’. Já é a segunda vez que o magistrado determina ao governo para retomar a lista.

Criada em 2003 pelo governo federal, a ”lista suja” é considerada pelas Nações Unidas um dos principais instrumentos de combate ao trabalho escravo no Brasil. A sua divulgação foi suspensa em dezembro de 2014, quando o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, atendeu a um pedido liminar de uma associação de incorporadoras imobiliárias que questionava a constitucionalidade do índex.

A DECISÃO DO JUIZ RUBENS CURADO http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/wp-content/uploads/sites/41/2017/01/liminartrabalhoescravo.pdf.

Após a publicação de uma nova portaria interministerial – número 4, de 13 de maio de 2016 -, com mudanças em critérios de entrada e saída do cadastro, a ministra Cármen Lúcia levantou a proibição.

Agora, por causa de uma ação civil do Ministério Público do Trabalho, a Justiça em Brasília voltou a determinar que o Ministério do Trabalho e a União publiquem a lista.

A decisão do juiz Rubens Curado ratifica a liminar do dia 19 de dezembro, que já havia determinado que o governo retomasse a lista, e atende aos pedidos formulados em ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público do Trabalho no Distrito Federal (MPT-DF).

Para o coordenador nacional de Erradicação do Trabalho Escravo (Conaete) do MPT, procurador do Trabalho Tiago Cavalcanti, a ratificação da liminar reconhece os fundamentos da ação civil pública. “O combate ao trabalho escravo é uma política de Estado, perene, independente e sem nenhum viés ideológico, motivo pelo qual a publicação da lista precisa ser feita”, disse.

A União recorreu argumentando que a Portaria Interministerial MT/MMIRDH nº 4, de 13 de maio de 2016, carece de ‘reformulação e aperfeiçoamento’ para só depois ser publicado o Cadastro de Empregadores.

O pedido foi negado pelo juiz que esclareceu que ‘não se descarta a possibilidade de se aperfeiçoar as regras atuais relativas ao Cadastro, na certeza de que toda obra humana é passível de aprimoramentos’. “Tal possiblidade, contudo, não inibe o dever de publicação imediata do Cadastro, fundado nas normas atuais que, repita-se, aprimoraram as regras anteriores e foram referendadas pelo STF.”

O juiz diz ainda que não há como ‘acolher a tese de que cabe exclusivamente ao Executivo a execução da política pública de combate ao trabalho escravo (na qual se insere a publicação do Cadastro de Empregadores), como corolário do atributo da independência entre os Poderes, observados os critérios de conveniência e oportunidade, sem interferência do Ministério Público ou do Judiciário. Recordo, uma vez mais, o exposto na decisão liminar, de que a omissão na publicação do Cadastro acaba por esvaziar, dia a dia, a Política de Estado de combate ao trabalho análogo ao de escravo no Brasil, notadamente considerando que tal publicação perdurava há mais de uma década e é reconhecida, inclusive por organismos internacionais, como uma das medidas mais relevantes e eficazes no enfrentamento do tema”.

Segundo ele, uma política de Estado, em um Estado Democrático de Direito, “não tem exclusividade de atuação, nem pode ficar a mercê de ventos ideológicos pessoais ou momentâneos’. “Em outras palavras, o Ministério do Trabalho tem o dever e a responsabilidade pela publicação do Cadastro, mas não a sua ‘propriedade’.”

Ao reanalisar a liminar, o juiz observou que a União, em caráter excepcional, pode fazer acordo judicial ou Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com os empregadores que venham a ser incluídos na primeira publicação da lista e que tenham contra si decisão administrativa final de procedência do auto de infração proferida antes da vigência da Portaria Interministerial n. 4/2016. Mas ressaltou que a celebração de acordo ou TAC não é pressuposto ou condição para a publicação do Cadastro.

Em caso de descumprimento da decisão, está prevista multa diária de R$ 10 mil, além da possibilidade da aplicação de outras medidas para a efetivação da liminar."

ROGÉRIO NEIVA - JUIZ DO TRABALHO - DEFENDE TESE SOBRE COMPORTAMENTO DAS PARTES NA CONCILIAÇÃO - UNB

A AMATRA 10  informa, com muito orgulho, que seu associado, o Juiz do Trabalho, Rogério Neiva Pinheiro, na data de hoje, obteve merecidamente o título de mestre em psicologia, na área de ciências do comportamento, na UNB.  A tese de sua dissertação teve como foco o comportamento das partes na conciliação.

A notícia desta vitória foi publicada no site do TRT da 10ª Região:

12/01/2017

Estudo foi elaborado no Instituto de Psicologia da UnB

O comportamento de escolha das partes do processo judicial nas audiências de conciliação na Justiça do Trabalho foi o tema escolhido pelo juiz Rogério Neiva Pinheiro para sua dissertação de mestrado, apresentada nesta quinta-feira (12), no Departamento de Processos Psicológicos Básicos do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília (UnB). A pesquisa envolveu investigação teórica e empírica e contou ainda com dados fornecidos pela Secretaria de Tecnologia do TRT da 10ª Região, além de informações obtidas em audiências.

Em sua pesquisa, o magistrado procurou entender o comportamento das partes em audiência a partir de um modelo de análise da psicologia que trabalha com a perda de valor das recompensas em função do atraso ou da incerteza no seu acesso. Segundo o juiz, “há ampla literatura e estudos na psicologia que comprovam que as consequências ou recompensas perdem valor subjetivo se não temos acesso a elas imediatamente ou se há uma incerteza quanto ao acesso”, explicou. O chamado “fenômeno do desconto” acontece nas audiências de conciliação quando as partes avaliam propostas de acordo.

Para o juiz Rogério Neiva, trata-se de uma forma diferente de entender o comportamento das partes. Inclusive, o estudo também constatou outra fato interessante, que é o chamado “efeito ancoragem”, ou seja, o valor da causa influencia nas propostas e nos acordos a serem firmados pelas partes. “O problema é que muitas vezes o valor da causa não corresponde à realidade da própria causa de pedir e o pedido. Ou seja, há um elemento inadequado influenciando o comportamento das partes”, analisou o magistrado.

Ainda de acordo com o juiz – que agora detém o título de mestre em psicologia, na área de ciências do comportamento – este é apenas um primeiro passo para investigação empírica sobre o tema. “Temos muito que estudar para entender as variáveis que estão por trás do comportamento que leva à aceitação ou rejeição do acordo como solução do processo judicial. Mas o fato é que são pessoas se comportando e fazendo escolhas”, concluiu.

O magistrado apresentou a tese de dissertação para a comissão examinadora formada pelos professores doutores Jorge Mendes Oliveira Castro, Cristiano Coelho, Julio Cesar Aguiar, e pelo juiz do Trabalho do TRT10 e professor da Faculdade de Direito da UnB, Paulo Henrique Blair de Oliveira. Com a aprovação, o juiz Rogério Neiva continuará desenvolvendo a pesquisa e, inclusive, foi aprovado na última seleção para o doutorado do Instituto de Psicologia da UnB. A proposta a partir de agora é analisar os processos que contaram com a coleta de dados nas audiências iniciais.

Na ocasião, o juiz Rogério Neiva agradeceu ao TRT10 e aos juízes de primeiro grau que colaboraram com a sua pesquisa.

(Bianca Nascimento) Núcleo de Comunicação Social - TRT 10ª Região – DF e Tocantins. E-mail: Este endereço de email está sendo protegido de spambots. Você precisa do JavaScript ativado para vê-lo.

ANAMATRA divulga nota pública em solidariedade à juíza Valdete Souto Severo

Notícia divulgada no site da ANAMATRA:http://www.anamatra.org.br/noticias/anamatra-divulga-nota-publica-em-solidariedade-a-juiza-valdete-souto-severo  

“A Anamatra divulgou nesta quarta-feira (11/01) nota pública em solidariedade à juíza do Trabalho Valdete Souto Severo. A magistrada, da 4ª Vara de Trabalho de Porto Alegre (RS), foi indevidamente constrangida, inclusive nas redes sociais, por sua correta atuação jurisdicional.

Recentemente, a magistrada determinou que cinco fundações do Rio Grande do Sul se abstivessem de demitir seus empregados sem prévia negociação coletiva com o sindicato das categorias, conforme entendimento firmado pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST). A decisão da magistrada foi confirmada em segunda instância e evitou a demissão imediata em massa de cerca de 1,2 mil trabalhadores.

A iniciativa de dispensa dos empregados veio após votação na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul de projeto que extinguiu nove fundações, uma companhia e uma autarquia no estado. A proposta faz parte do pacote de medidas do governador do estado, José Ivo Sartori (PMDB), para conter a crise financeira no RS.”

Nota pública

A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho - ANAMATRA, entidade representativa de mais de 4.000 juízes do Trabalho em todo o Brasil, vem a público solidarizar-se com a juíza do Trabalho Valdete Souto Severo subscrevendo, desse modo, a Nota Pública divulgada pela Associação dos Magistrados do Trabalho da 4ª Região (Amatra IV), nessa terça-feira, dia 10 de janeiro, o que o faz nos seguintes termos:

1 - A magistrada Valdete Souto Severo, na linha de precedentes do Tribunal Superior do Trabalho (TST), determinou a empresas públicas e fundações do estado do Rio Grande do Sul que se abstivessem de promover dispensas em massa de seus empregados, sem prévia negociação coletiva, sob pena de pagamento de multa por cada trabalhador eventualmente atingido em caso de descumprimento.

2 - Da mesma forma, diante de um inconcebível anúncio antecipado por parte do Secretário de Governo do estado do Rio Grande do Sul de que tais dispensas deveriam ser processadas para evitar reintegrações na Justiça do Trabalho, a magistrada, com igual correção, determinou que esses entes administrativos se abstivessem de esvaziar as suas atividades, o que poderia ocorrer com a clara finalidade de frustrar a aplicação da legislação social.

3 - Idênticas decisões da aludida magistrada, nessa mesma matéria, vêm sendo confirmadas pelo TRT da 4ª Região e reafirmam os compromissos da julgadora com os princípios constitucionais e do Direito do Trabalho, que devem falar ainda mais alto em momentos como esses.

4 - Ressalta a Anamatra que a independência é garantia fundamental na atuação jurisdicional, atendendo sempre ao valor democrático e republicano do direito ao livre convencimento motivado no ato de julgar, destinado a construir a paz social, inclusive quando controla abusos do poder político, econômico ou simplesmente de agentes públicos.

5 – A Anamatra associa-se à Amatra 4 (RS) para repudiar as críticas desqualificadas e o jogo da desinformação, renovando irrestrito apoio à juíza Valdete Souto Severo.

Brasília, 11 de janeiro de 2017

Germano Silveira de Siqueira

Presidente da Anamatra

CULMINÂNCIA - TRABALHO E CIDADANIA NA ESCOLA: TENDO O TRABLHO EM FOCO

Sob a coordenação do Juiz Ricardo Machado Lourenço Filho, aconteceu no último dia 02/12/2016, a Culminância do Trabalho e Cidadania na Escola: Tendo o Trablho em Foco, ocorreu na sala de sessões do Tribunal Pleno do TRT da 10ª Região.   “Como os cidadãos exercem seus direitos? E como eles representam o exercício desses direitos? Os alunos de diversas escolas do Distrito Federal fizeram uma demonstração a esse respeito, quando, na sexta-feira, dia 2 de dezembro de 2016, participaram da Culminância do Projeto Trabalho e Cidadania na Escola: tendo o trabalho em foco, conduzido, no Distrito Federal, pela Associação dos Magistrados da Justiça do Trabalho da 10ª Região – AMATRA 10. A Culminância contou com várias apresentações dos alunos, envolvendo temas relacionados ao trabalho e à justiça social, como o direito à diferença, meio ambiente sadio de trabalho e respeito aos direitos da personalidade. Conceitos como assédio moral e cidadania, por exemplo, foram traduzidos em manifestações artísticas pelos alunos, que demonstraram uma significativa compreensão da importância dos direitos fundamentais como bandeira de luta e de reivindicação na sociedade. O evento não poderia ter sido mais simbólico. Além do conteúdo marcadamente social e inclusivo das apresentações dos alunos, a Culminância foi realizada num local especial: na sala de sessões do Pleno do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região. Certamente uma marca para a história dessa importante Corte de justiça social. A Culminância celebrou o encerramento das atividades do Projeto “Trabalho e Cidadania na Escola” no ano de 2016 e contou com uma expressiva participação de aproximadamente 250 alunos e professores das seguintes escolas do DF: RENAPSI, CEM 111 do Recanto das Emas, GISNO, CEM 417 de Santa Maria, EJA de Taguatinga, CEE 01 de Brasília e CEF 08 de Sobradinho II. O evento teve a presença da Exma. Vice-Presidenta do Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região, Desembargadora Maria Regina Machado Guimarães, do Desembargador Mário Macedo Fernandes Caron, da Presidenta da AMATRA 10, Juíza Rosarita Machado de Barros Caron, e do Juiz Ricardo Lourenço Filho, coordenador do Programa no âmbito da 10ª Região. Participaram, ainda, o Sr. Celso Elói, Superintendente da Caixa Econômica Federal, relevante parceira da AMATRA 10, e a Sra. Sandra Amélia, representando a Secretaria de Educação do DF. Ao término do evento, houve uma contagiante apresentação do grupo de percussão Batalá.” Ricardo Machado Lourenço Filho.            Coordenador Fotos do evento [gallery ids="1876,1877,1878"]

16º ENCONTRO DOS MAGISTRADOS DO TRABALHO DA 10ª REGIÃO- DF E TO

enc-magistrados-iberostar-bahia-8-a-11-12-2016-479 Realizou-se o 16º Encontro dos Magistrados do Trabalho da 10ª Região (DF e TO), de 08 a 11 de dezembro de 2016. O evento contou com uma programação científica composta de três palestras. Aenc-magistrados-iberostar-bahia-8-a-11-12-2016-429 primeira, a cargo do Juiz do Trabalho Guilherme Guimarães Feliciano, do TRT da 15ª Região (Campinas/SP), e também vice-presidente da Anamatra, versou sobre os projetos de modificação de normas trabalhistas em trâmite no Congresso Nacional. Ele ressaltou a índole publicista do Direito do Trabalho, que deve tutelar o trabalhador mesmo em relações não contratuais, e indicou três projetos de lei que visam à melhoria dessa tutela (regulação da terceirização de forma adequada e com responsabilidade do tomador de serviços; modificações no capítulo da CLT sobre saúde e segurança no trabalho; e previsão da “ação promocional trabalhista”, que permitirá ao juiz transformar a ação individual em ação coletiva quando o interesse tutelado assim requerer). enc-magistrados-iberostar-bahia-8-a-11-12-2016-332A segunda palestra foi ministrada pelo Juiz do Trabalho Roberto Fragale, do TRT da 1ª Região (RJ), e tratou do esgarçamento da magistratura do trabalho em tempos de crise, ressaltando os diversos fatores presentes na carreira que têm causado a transformação de dissensos em confrontos, com a presença de interesses múltiplos e conflitantes entre colegas, concluindo pela necessidade de repensarmos o papel do juiz do trabalho, a sua importância para a democracia e a prática da alteridade como forma de se evitarem esses confrontos. Eenc-magistrados-iberostar-bahia-8-a-11-12-2016-197ncerrando a parte científica do evento, o professor Leandro Karnal, doutor em História pela USP, proferiu a palestra "Conhecimento, Trabalho e Tempo no Mundo Contemporâneo", tratando de diversos aspectos sobre conhecimentos na vida pessoal e profissional para gerar mudanças futuras, necessidade de se viver o momento presente com foco, para que possa fazer sentido e gerar enc-magistrados-iberostar-bahia-8-a-11-12-2016-361frutos, meios para não se incomodar com críticas infundadas para as pessoas que lidam com público, e também falando da importância do ócio criativo nos momentos de lazer.   O Encontro cumpriu sua finalidade de reunir e unir os magistrados do trabalho da 10ª Região para discussão de temas importantes e que estão presentes na rotina de todos nós.   Nossos agradecimentos a CAIXA, parceira do evento há 16 anos.

Somos a favor da moralização e observância do teto salarial

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Somos a favor da moralização e observância do teto salarial. O que não aceitamos é o massacre e a submissão que o Legislativo quer nos impor.

É preciso esclarecer que a magistratura federal (Comum e do Trabalho) não recebe supersalários.

Apoiamos qualquer iniciativa que tenha por finalidade a moralização de vencimentos nesse país, abrangendo todos os Poderes da República: Judiciário, Executivo e também o Legislativo.

As associações nacionais não fizeram lobby contra a extinção dos supersalários, e sim contra normativos visivelmente inconstitucionais e contra as intenções obscuras dos parlamentares que estão na mira da lava jato. Mais uma vez reafirmamos: Não somos a favor dos Supersalários e não os recebemos.

Os PLS aprovados ontem pelo Senado Federal, independente do mérito da questão, e outros tantos que estarão na pauta de hoje, não têm objetivos nobres como quer fazer crer o presidente do senado. Na verdade, conforme anunciou o Senador Renan Calheiros, todos os projetos que prejudicam, de alguma forma, a Magistratura e o Ministério Público estarão em pauta.

Tudo aconteceu, coincidentemente, depois que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, protocolou na segunda-feira, dia 12/12, no Supremo Tribunal Federal (STF), a primeira denúncia derivada da Operação Lava Jato contra o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que é acusado de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

O Senador Renan Calheiros já é réu perante o STF em uma ação penal e alvo de outros 10 inquéritos, portanto, não há como negar que as suas ações apenas retratam o seu ódio e, em verdadeiro abuso de autoridade, que, falaciosamente, diz combater, tenta calar e fragilizar as instituições que podem punir os seus crimes. Induz a população em erro para que se posicione contra o Poder Judiciário, dizendo que a magistratura recebe mais de R$ 100.000,00, por mês, o que não é verdade. Consta do Portal da transparência de todos os TRTs os contracheques de seus magistrados, que podem ser consultados por qualquer interessado.

O subsídio Bruto de um Juiz Titular de Vara da Justiça do Trabalho é de R$ 28.947,55 + R$ 884,00 (alimentação) = R$ 29.831,55. Desconta-se de Imposto de renda o valor de R$ 6.215,55, de PSSS (Previdência): R$ 3.184,23, de Saúde TRT: R$ 504,00 e de contribuição associativa: R$ 473,50. Total de descontos: R$ 10.881,28, só para a União (IR e PSSS) o desconto é de R$ 9.903,78. Valor líquido: 18.950,27.

Sempre aprendi que o Congresso Nacional é a casa do povo, mas, ultimamente, todos têm visto que o povo está proibido de entrar nas duas casas: Câmara e Senado.

O mais interessante é que na casa da Justiça nenhum cidadão é impedido de entrar. E é na Justiça que o povo encontra a garantia de seus direitos.

Não deixe que o Poder Legislativo feche também as portas do Judiciário para o povo. Resista e não acredite em mentiras contadas por aqueles que são alvos de investigação de crimes.

Ontem, o Senador Renan Calheiros, em atitude déspota, ou seja, de forma arbitrária e opressora, determinou que os magistrados fossem retirados do Plenário. Hoje, repetiu a mesma arbitrariedade.

Vimos algumas manifestações favoráveis a esse ato. Alguns podem estar pensando que essa barbaridade foi uma atitude corajosa, mas é preciso que esse país pare e pense sobre o que está acontecendo.

O Senador, que já é réu em um processo e investigado em outros 10 inquéritos, como disse anteriormente, está buscando, visível e incontestavelmente, enfraquecer o Poder Judiciário e o Ministério Público, pois a todo momento quer reger e aprovar leis de interesse próprio, a exemplo do PLS 280 apensado ao PLC 80/2016 (das dez medidas adulterado) que querem aprovar neste momento.   Se aprovado, seguirá direto para sanção presidencial e provavelmente dificultará as investigações da lava jato, operação da qual o Senador Renan Calheiros e tantos outros parlamentares são investigados.

Que país é esse?!?!?!?

Resistir e Lutar. Não tem outro caminho.

A Magistratura não se entregará.

SAIBA MAIS SOBRE DIREITO DO TRABALHO NO FUTEBOL - POR MARCOS ULHOA

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A JUSTA CAUSA PRATICADA PELO JOGADOR PROFISSIONAL DE FUTEBOL E A SUA TIPIFICAÇÃO

  Por Marcos Ulhoa Dani  

A doutrina e a jurisprudência trabalhista desportiva já analisaram, em reiteradas vezes, a existência de justa causa patronal de clubes em contratos de atletas profissionais de futebol. Todavia, um tema ainda pouco explorado é a incidência, ou não, de justa causa praticada pelo próprio jogador de futebol e a sua caracterização, bem como as consequências de tal ocorrência, tão grave ela é para as partes envolvidas no contrato especial de trabalho desportivo. Este é o objeto do presente estudo.

Nos dias atuais, passou a ser comum o ajuizamento de ações pelos atletas contra os clubes, normalmente acompanhados de pedidos liminares de antecipação de tutela, em que se pleiteia a rescisão indireta do contrato pela violação de deveres patronais. As alegações mais usuais dizem respeito a potenciais violações dos arts. 31, 34 (e incisos) e 39, §2o – este último no caso de empréstimo – da lei 9.615/98 (Lei Pelé). Ademais, há, ainda, pela aplicação do art. 28, §4o da mesma lei, a possibilidade de arguição de ocorrência de alguma das hipóteses das alíneas do art. 483 da CLT, haja vista que o contrato de trabalho desportivo não deixa de tratar de uma relação de emprego entre o atleta empregado e o clube empregador. A ruptura contratual por justa causa do empregador gerará, entre outros efeitos possíveis, o pagamento, pelo antigo empregador, da chamada cláusula compensatória desportiva em favor do atleta.

Por outro lado, é cada vez mais frequente a divulgação, na mídia esportiva, de ocorrências de atitudes dos atletas que, potencialmente, podem gerar a rescisão do contrato de trabalho por violação das obrigações dos jogadores, com todas as consequências advindas desta potencial situação. A carreira de um jogador de futebol profissional em alto nível, salvo honrosas exceções, é consideravelmente curta e inicia-se, a rigor, em tenra idade. É usual testemunharmos garotos de 17, 18 ou 19 anos assinando, no início de suas carreiras, contratos com até 5 anos de duração, envolvendo cifras financeiras altíssimas e que transformam, completamente, as perspectivas dos atletas e de suas famílias. Não é difícil imaginar que os atletas, naquelas idades, em regra, não detêm a maturidade desenvolvida suficientemente para lidar com as novas e enormes expectativas que são depositadas em seus ombros. Ademais, a nova realidade financeira e o acesso quase ilimitado a bens da vida, antes inatingíveis, pode gerar nos jovens atletas um “deslumbramento” que, se não for bem orientado e controlado, pode prejudicar o desempenho desportivo do profissional e a continuidade de sua carreira.

Além da situação dos atletas jovens, não raro, observa-se que até profissionais de certa rodagem se veem envolvidos em situações de potencial quebra de contrato por culpa do empregado, podendo haver a aplicação de justa causa pelo empregador, com todas as suas consequências, inclusive a potencial demanda pelo pagamento da chamada cláusula indenizatória desportiva em favor do clube empregador. A mídia esportiva já noticiou, reiteradamente, atitudes de atletas que violaram potencialmente os deveres que o profissional deve ter com seu clube empregador, como, ilustrativamente: o jogador entoar, publicamente, hino ou cântico de clube ou torcida rival; se envolver em crime, ou ser preso em flagrante delito, maculando a imagem do clube empregador ou impossibilitando a prestação de serviços; expressar, em entrevista televisiva ou rede social, desprezo ou desacato ao clube empregador ou à sua história; fazer uso excessivo de bebidas alcoólicas ou substâncias alucinógenas que comprometam seu rendimento desportivo; ser flagrado em exame anti-doping por uso de drogas ilícitas, gerando punições que inviabilizem a sua prestação de trabalho ou que gerem punições desportivas ao clube empregador; deixar, propositalmente, de converter uma penalidade máxima em jogos oficiais por torcer, publicamente, para o time adversário; se envolver em briga em arena desportiva ou fora dela, injustificadamente, contra torcedores, árbitros e adversários; deixar de atuar com dedicação nos jogos, em razão de recebimento indevido de valores ou vantagens de terceiros; entre outras ocorrências. A grande cobertura televisiva e as mídias sociais potencializam a divulgação de tais atitudes perante a torcida, imprensa, patrocinadores e dirigentes, potencializando o seu caráter nocivo ao clube empregador. E nem se diga que as atitudes do atleta fora das partidas e treinamentos estaria infensa à eventual análise e aplicação de justa causa, pois, ainda mais nos dias atuais em que as mídias sociais, a internet e a televisão, em tempo real, conectam a todos, a conduta social do atleta profissional repercute não somente perante o clube empregador, mas repercute também perante a torcida, imprensa, clubes rivais, patrocinadores e dirigentes. Neste sentido, a Exma. Professora e Desembargadora Federal do Trabalho, Dra. Vólia Bonfim Cassar, que, em seus termos, alerta que tal aferição pode ser feita quando “a conduta social do empregado repercutir diretamente na relação contratual” [1].

Howard Wilkinson, técnico de futebol inglês, observou que os jogadores de talento representam risco enorme para si mesmos, em livro do matemático britânico e especialista em Desenvolvimento Humano, Mike Carson:

“Tem se tornado mais difícil à medida que as recompensas se tornaram maiores. Atualmente, o craque tem mais oportunidades de explorar a si mesmo do que jamais aconteceu. Simplesmente não há um limite. Se eu tenho um truque na manga e eu tenho um ego inflado, o que vou fazer? O que vou dizer? Quantas pessoas serão afetadas por isso? Quem vai perceber? Nos dias de hoje, ao final de uma partida, é possível pegar um avião e ir até Nova York, fazer muita besteira numa boate, pegar outro avião de volta e estar no You Tube em seguida. E então temos um jogo importante na quarta à noite…”(…)”Como Wilkinson relata, cinquenta anos atrás o craque saía de ônibus com os colegas numa noite de sábado: “Ele podia até beber, tomar umas cervejas a mais, ou se meter numa briga, mas a não ser que fosse algo realmente grave, jamais seria notícia nos jornais no dia seguinte por causa disso. O técnico ligava para o repórter e pedia para não escrever sobre o assunto, oferecendo uma notícia em primeira mão na semana seguinte” (…) Não são apenas os perigos que aumentaram, mas também as falhas se tornaram mais públicas. Nunca foi tão complicado criar um ambiente vitorioso e promover comportamentos que permitam alcançar o sucesso”[2] .

Como lembra o Exmo. Ministro Maurício Godinho Delgado, em sua obra Curso de Direito do Trabalho, a tipificação da justa causa obreira não tem, sempre, seus traços e contornos rigidamente fixados na legislação. Diz:

“A tipificação trabalhista pode ser, desse modo, significativamente mais flexível e plástica do que a configurada no Direito Penal. Um exemplo dessa plasticidade é dado pela justa causa prevista no art. 482, “b”, CLT, isto é, mau procedimento. Ora a plasticidade e imprecisão desse tipo legal trabalhista deixa-o muito distante do rigor formal exigido por um tipo legal penalístico.”[3]

Neste ponto, é imprescindível lembrar que o atleta profissional de futebol não deixa de ser um empregado, haja vista que assina um contrato de trabalho especial. Como empregado, detém uma série de deveres para com o clube empregador, tal como o dever de Lealdade, imprescindível para que se mantenha a fidúcia necessária entre o clube e o profissional, na manutenção do liame empregatício.

O artigo 35 da Lei Pelé enumera os deveres básicos dos atletas profissionais, quais sejam:

Art. 35. São deveres do atleta profissional, em especial: (Redação dada pela Lei nº 9.981, de 2000)

I – participar dos jogos, treinos, estágios e outras sessões preparatórias de competições com a aplicação e dedicação correspondentes às suas condições psicofísicas e técnicas; (Incluído pela Lei nº 9.981, de 2000)

II – preservar as condições físicas que lhes permitam participar das competições desportivas, submetendo-se aos exames médicos e tratamentos clínicos necessários à prática desportiva; (Incluído pela Lei nº 9.981, de 2000)

III – exercitar a atividade desportiva profissional de acordo com as regras da respectiva modalidade desportiva e as normas que regem a disciplina e a ética desportivas.

Além destes deveres, o atleta empregado detém deveres como todo empregado, podendo suas atitudes serem enquadradas nas hipóteses das alíneas do art. 482 da CLT. É preciso lembrar que a caracterização da justa causa obreira deve representar uma atitude grave, que leve à completa ruptura do liame empregatício e quebra da fidúcia básica que deve haver entre o atleta profissional e o clube empregador. O contrato de trabalho desportivo é um contrato de trabalho especial e que, por sua natureza especial, permite a inclusão de cláusulas extras decorrentes do Poder Disciplinar que é decorrente desta peculiar relação de trabalho. Lembra-se que, na esteira da Teoria Contratualista prevalente no Direito do Trabalho, o Poder Disciplinar do empregador tem como fundamento o próprio contrato de trabalho, que subordina, juridicamente, o empregado ao empregador. Assim, entendemos que é possível ao clube empregador aplicar, com razoabilidade e proporcionalidade, multas por descumprimentos contratuais do atleta, previstos em contrato. Por exemplo, o clube pode aplicar uma multa financeira de desconto de percentual de salário do atleta por atraso ou falta injustificada do atleta a um treino, pois tal apenamento é uma decorrência natural da ausência injustificada do trabalho. A ausência injustificada do trabalho equivale a uma suspensão contratual, o que leva à ausência de vencimentos, sendo que, quanto ao atleta profissional de futebol, diferentemente de outros trabalhadores comum, a penalidade pecuniária é permitida. O magistério de Gustavo Felipe Barbosa Garcia vai na mesma linha:

“Deve-se destacar que a “multa”, ou seja, a pena pecuniária, em regra, não é admitida como medida disciplinar válida em nosso Direito do Trabalho, inclusive por contrariar o princípio da intangibilidade salarial (art. 462 da CLT). No entanto, como exceção, há previsão especial autorizando a aplicação da multa (penalidade pecuniária) ao atleta profissional. Nesta mesma linha excepcional, o art. 48, III, da Lei 9.615/1998, pertinente ao atleta profissional…” [4]

Em um ambiente de trabalho em que a disciplina nos treinamentos implica em melhora do rendimento desportivo, a aplicação de multa em casos como o descrito é razoável, lembrando que a atividade do atleta profissional não detém a obrigação de que o atleta e sua equipe ganhem os jogos. Há, todavia, nos termos do art. 35, I, da Lei Pelé, a obrigação do atleta de se dedicar ao máximo nos treinos e jogos, de modo correspondente às suas condições psicofísicas e técnicas. Uma vez aplicada tal penalidade de multa, em relação àquela atitude específica de atraso injustificado a treinamento, não poderá haver mais nenhuma punição ao atleta pelo princípio do “no bis in idem” ou vedação à dupla penalidade de um mesmo fato. Todavia, se o atleta voltar a se atrasar, nova multa poderá ser aplicada, pois a atuação do Poder Disciplinar do empregador pode analisar cada fato de modo apartado, gerando para cada malferimento do contrato, uma reação correspondente.

É necessário pontuar que a Justiça do Trabalho não pode adentrar, em regra, na mensuração da punição aplicada ao empregado. Pode, todavia, verificar a razoabilidade e proporcionalidade da punição, bem como pode avaliar a sua legalidade, ou não. Em outras palavras, a Justiça do Trabalho não pode transformar uma multa aplicada ao jogador de R$10.000,00 em uma multa de R$2.000,00, pois tal atitude significaria adentrar, indevidamente, ao âmago do Poder Disciplinar do empregador. Por outro lado, observadas as circunstâncias do caso, a Justiça do Trabalho pode anular ou confirmar a multa aplicada. O mesmo se dá em relação a uma aplicação de justa causa ao atleta. A Justiça do Trabalho não pode, por exemplo, transformar uma justa causa em suspensão contratual. Pode, ao revés, verificar se a justa causa aplicada foi, ou não, proporcional, razoável ou legal, mantendo-a ou anulando-a. Neste sentido, é o magistério da professora e Desembargadora do Trabalho, a Exma. Vólia Bonfim Cassar:

“Ao juiz não é dado o condão de graduar a pena, pois não é o detentor do poder disciplinar, nem vivenciou aquela relação. Resta ao Judiciário manter ou elidir a penalidade aplicada.”[5]

Em uma demanda deste jaez perante a Justiça do Trabalho, na esteira do que defende o Ministro Maurício Godinho Delgado, será necessário verificar a existência dos requisitos objetivos, subjetivos e circunstanciais do fato para a confirmação, ou não, da justa causa obreira.

“Objetivos são os requisitos que concernem à caracterização da conduta que se pretende censurar; subjetivos, os que concernem ao envolvimento (ou não) do trabalhador na respectiva conduta; circunstanciais, os requisitos que dizem respeito à atuação disciplinar do empregador em face da falta e do obreiro envolvidos.”[6]

Dentre os requisitos circunstanciais a doutrina e jurisprudência destacam a observância do critério da gradação de penalidades, como um caráter pedagógico do Poder Disciplinar. Em outras palavras, a interpretação é de que seria necessário, inicialmente, fazer punições mais brandas, e, no caso de reiteração de condutas, passar a punições mais pesadas, até a chegada à aplicação de justa causa, com todas as suas consequências. Dentre as consequências de uma ruptura contratual por justa causa estão, por exemplo, a perda do direito a férias proporcionais+1/3 (Súmula 171 do TST) e a perda do direito a 13o salários proporcionais (art. 3o, da lei 4090/62). Mais especificamente quanto ao contrato de atleta profissional de futebol, no caso de caracterização de justa causa obreira, haverá uma incidência ainda mais grave: a possibilidade do clube empregador cobrar do atleta a cláusula indenizatória desportiva, nos termos do art. 28, I, da lei 9.615/98, caso, após a ruptura, o atleta passe a atuar por outro clube, momento em que o novo empregador, potencialmente, poderá ser responsabilizado solidariamente, nos termos do art. 28, §2o da Lei Pelé:

“§ 2º São solidariamente responsáveis pelo pagamento da cláusula indenizatória desportiva de que trata o inciso I do caput deste artigo o atleta e a nova entidade de prática desportiva empregadora. (Redação dada pela Lei nº 12.395, de 2011).”

Frisa-se que essas perdas de direito são meras consequências da penalidade de justa causa, e não podem ser interpretadas como dupla penalidade. Tais descontos e consequências são faculdades legislativas conferidas ao ex-empregador, que não se confundem com as punições disciplinares aplicadas.

Destaca-se que uma única atitude do atleta pode incompatibilizar, perpetuamente, a sua relação empregatícia com o clube empregador, dada a sua gravidade. Em outras palavras, não seria necessária a gradação de penalidades antes da aplicação de justa causa, se a atitude do atleta for de uma gravidade tal que quebre, indelevelmente, a fidúcia necessária para a existência do liame empregatício. Neste sentido também leciona o Exmo. Ministro Maurício Godinho:

“O critério pedagógico de gradação de penalidades não é, contudo, absoluto e nem universal – isto é, ele não se aplica a todo tipo de falta cometida pelo trabalhador. É possível a ocorrência de faltas que, por sua intensa e enfática gravidade, não venham ensejar qualquer viabilidade de gradação na punição a ser deferida, propiciando, assim, de imediato, a aplicação da pena máxima existente no Direito do Trabalho (dispensa por justa causa).” [7]

Vale dizer que a justa causa deve ser avaliada de acordo com as circunstâncias do caso. Diz a professora Vólia Cassar:

“A apreciação da falta do trabalhador deve ser avaliada em cada caso de forma concreta ou subjetiva isto é, levando-se em consideração a personalidade do agente, a intencionalidade, os fatos que levaram o empregado à prática daquele ato, a ficha funcional pregressa, os antecedentes, as máculas funcionais anteriores; o grau de instrução ou de cultura, a época; o critério social etc.[8]”

Especificamente quanto à caracterização da justa causa obreira em um contrato de trabalho desportivo, tendo em vista as últimas ocorrências divulgadas na mídia, o que nos parece fundamental para a caracterização, ou não, da justa causa obreira é a análise do Princípio da Lealdade entre atleta e agremiação empregadora, pois, a rigor, o atleta incorpora a imagem de seu clube empregador. Mike Carson, corretamente, observa:

“O futebol é um negócio estranhamente territorial. Somos nós, os torcedores, que fazemos com que seja assim. Definimos nosso clube pelo nosso comprometimento. E, para muitos de nós, é o clube que nos define. As pessoas veem um indivíduo de modo diferente quando ele declara para qual time torce. Da mesma forma, quando um jogador é contratado por um clube, ele passa a vestir uma espécie de manto sagrado. O clube paga um bom salário e, em retribuição, requer não apenas seu talento, mas sua lealdade. Os torcedores ao redor do mundo portam faixas e bandeiras que exigem paixão e comprometimento do time, pois cada jogador é visto como “um de nós”.[9] – grifei

Ou seja, ao se portar perante terceiros, sociedade e mídia, o jogador transmite não somente a sua imagem, mas do clube que representa e assim é visto por torcedores. Ter uma atitude que denigra a imagem do pavilhão que representa, pode incompatibilizar a relação do atleta com a torcida, com os dirigentes, patrocinadores e o clube, quebrando-se a relação especial de fidúcia que é necessária para a manutenção do liame empregatício. Assim, os exemplos dados acima podem, potencialmente, dentro da tipificação plástica de hipóteses de justas causas obreiras previstas na legislação, serem enquadradas na penalidade máxima existente dentro do Direito do Trabalho.

Com efeito, podem, dependendo sempre da análise, peculiaridades, histórico e circunstâncias do caso concreto, se caracterizarem como justa causa as seguintes atitudes exemplificativas: o jogador entoar publicamente hino ou cântico de clube ou torcida rival (art. 482, “b” e “k” da CLT); se envolver em crime com trânsito em julgado (art. 482, “b”, “d” e “k”, da CLT), ou ser preso em flagrante delito (art. 482, “k” e “i”, da CLT, na medida em que entendemos que a ausência ao serviço por prisão em flagrante se caracteriza como falta injustificada, pois a ninguém é dado a ignorância da lei e, se capturado em flagrante delito, o agente assumiu o risco de ser preso e, por consequência, assumiu o risco de faltar injustificadamente ao serviço), maculando a imagem do clube empregador e/ou impossibilitando a prestação de serviços; expressar, em entrevista televisiva ou rede social, desprezo ou desacato ao clube empregador ou à sua história (art. 482, “b” e “k”, da CLT); fazer uso excessivo de bebidas alcoólicas ou substâncias alucinógenas que comprometam seu rendimento desportivo (art. 35, I e II, da Lei 9.615/98 e art. 482, “e”, “f”, “h”; ser flagrado em exame anti-doping por uso de drogas ilícitas, gerando punições que inviabilizem a sua prestação de trabalho ou que gerem punições desportivas ao clube empregador (art. 35, III, da Lei 9.615/98 e art.482, “b”, “f” e “k” da CLT); deixar, propositalmente, de converter uma penalidade máxima em jogos oficiais por torcer, publicamente, para o time adversário (art. 482, “b” e “d”, da CLT e art. 35, I, da Lei 9.615/98); se envolver em briga em arena desportiva ou fora dela, injustificadamente, contra torcedores, árbitros e adversários (art. 482, “b” e “j” da CLT); atrasos reiterados a treinos, viagens e jogos (art. 482, “b”, “e” e art. 35, I e II, da lei 9.615/90), deixar de atuar com dedicação nos jogos, em razão de recebimento indevido de valores pecuniários ou vantagens de terceiros (art. 482, “a” e art. 35, I e III da Lei 9.615/98).

Apesar de todas estas ponderações, é preciso pontuar que o atleta detém uma força de trabalho que é patrimônio do clube empregador, pois o jogador, em uma potencial futura transferência, pode gerar enormes ganhos patrimoniais ao clube empregador, detentor definitivo de seus direitos federativos. Além disto, pode gerar ganhos ao clube que tenha participado de sua formação ou tenha sido seu empregador nos primeiros anos de carreira, gerando, respectivamente, a indenização/compensação por formação ou indenização pelo “mecanismo de solidariedade” da FIFA. Assim, nos parece claro que a caracterização, ou não, da justa causa obreira, com todas as suas consequências, dar-se-á pela interpretação da Justiça do Trabalho em ação judicial, razão pela qual o clube empregador deve, de fato, estar certo do descumprimento contratual grave do empregado a fim de intentar esta via de procedimento, pois, em eventual improcedência do seu intento, o clube empregador poderá arcar, ao revés, em provável reconvenção/ação originária, com todos os ônus de uma dispensa imotivada e adiantada do atleta, inclusive arcando com a chamada cláusula compensatória desportiva.

  Notas:   [1] CASSAR, Vólia Bonfim – 12a ed. rev., atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, pg. 1073.   [2] CARSON, Mike. Os campeões: por dentro da mente dos grandes líderes do futebol/ Mike Carson; tradução de Candice Soldatelli. Caxias do Sul, RS: Belas-Letras, 2015, pg. 79.   [3] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho; 8a Ed., São Paulo: Ltr, 2009, pg. 1088.   [4] GARCIA, Gustavo Felipe Barbosa. Curso de direito do trabalho – 6a ed. rev., atualizada e ampliada – Rio de janeiro: Forense, 2012, pg. 338.   [5] CASSAR, Vólia Bonfim – 12a ed. rev., atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, pg. 1062.   [6] DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho; 8a Ed., São Paulo: Ltr, 2009, pg. 1091.   [7] DELGADO, Maurício Godinho. Op. Cit., pg. 1097.   [8] CASSAR, Vólia Bonfim – 12a ed. rev., atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016, pg. 1072.   [9] CARSON, Mike. Os campeões: por dentro da mente dos grandes líderes do futebol/ Mike Carson; tradução de Candice Soldatelli. Caxias do Sul, RS: Belas-Letras, 2015, pg. 54.   Referências Bibliográficas:   CARSON, Mike. Os campeões: por dentro da mente dos grandes líderes do futebol/ Mike Carson; tradução de Candice Soldatelli. Caxias do Sul, RS: Belas-Letras, 2015.   CASSAR, Vólia Bonfim – 12a ed. rev., atualizada e ampliada. Rio de Janeiro:Forense; São Paulo: MÉTODO, 2016.   DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho; 8a Ed., São Paulo, Ltr, 2009.   GARCIA, Gustavo Felipe Barbosa. Curso de direito do trabalho – 6a ed. rev., atualizada e ampliada – Rio de janeiro: Forense, 2012. marcos-ulhoa

*Marcos Ulhoa Dani é Juiz do Trabalho da 10ª Região. Especialista em Direito Processual e Material do Trabalho. Autor do livro “Transferências e Registros de Atletas Profissionais de Futebol – Responsabilidades e Direitos”.

HOMENAGEM AO GRANDE POETA FERREIRA GULLAR

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Ferreira Gullar faleceu no último dia 04/12.

Gullar foi um guerreiro, forte e, acima de tudo humano. Também foi autor de poemas musicados por grandes artistas brasileiros: “Traduzir-se” (Fagner), “Minha” (Francis Hime), “Bela” (Milton Nascimento), entre outras.

A letra da música de Villa-Lobos, “O trenzinho Caipira”, foi escrita por Ferreira Gullar.

Ainda bem que os poetas nunca morrem, porque vivem eternamente em suas poesias, lidas e relidas por gerações e gerações durante décadas, séculos e até milênios.

Nossa Homenagem à Ferreira Gullar:

 

Não sei quantas almas tenho

 

Não sei quantas almas tenho.

Cada momento mudei.

Continuamente me estranho.

Nunca me vi nem acabei.

De tanto ser, só tenho alma.

Quem tem alma não tem calma.

Quem vê é só o que vê,

Quem sente não é quem é,

Atento ao que sou e vejo,

Torno-me eles e não eu.

Cada meu sonho ou desejo

É do que nasce e não meu.

Sou minha própria paisagem;

Assisto à minha passagem,

Diverso, móbil e só,

Não sei sentir-me onde estou.

Por isso, alheio, vou lendo

Como páginas, meu ser.

O que segue não prevendo,

O que passou a esquecer.

Noto à margem do que li

O que julguei que senti.

Releio e digo: “Fui eu?”

Deus sabe, porque o escreveu.

 

Traduzir-se

Uma parte de mim

é todo mundo:

outra parte é ninguém:

fundo sem fundo.

Uma parte de mim

é multidão:

outra parte estranheza

e solidão.

Uma parte de mim

pesa, pondera:

outra parte

delira.

Uma parte de mim

almoça e janta:

outra parte

se espanta.

Uma parte de mim

é permanente:

outra parte

se sabe de repente.

Uma parte de mim

é só vertigem:

outra parte,

linguagem.

Traduzir-se uma parte

na outra parte

– que é uma questão

de vida ou morte –

será arte?

 

Frases

“Como um tempo de alegria, por trás do terror me acena,... E a noite carrega o dia, no seu colo de açucena... Sei que dois e dois são quatro, Sei que a vida vale a pena,... mesmo que o pão seja caro e a liberdade, pequena...”

“...Uma parte de mim pesa, pondera:

outra parte delira...”

“Não quero saber do sofrimento, quero é felicidade. Não gosto de fazer lamúrias. Uma vez, discuti feio sobre determinada situação. Fiquei sozinho em casa, cheio de razão e triste pra cacete. Então, pra que querer ter sempre razão? Não quero ter razão. Quero é ser Feliz!”

 

É PRECISO SABER A VERDADE SOBRE O PODER JUDICIÁRIO - TRABALHO DEMAIS E ESTRUTURA DE MENOS

Magistratura trabalhista repudia declarações de presidente da OAB-CG

    amatra-13

A Associação dos Magistrados do Trabalho da 13ª Região (Amatra 13) vem, por meio de sua diretoria, repudiar as declarações do presidente da Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de Campina Grande, Jairo Oliveira, feitas em emissora de rádio daquela cidade, na manhã deste dia 2 de dezembro, quando instado a se pronunciar sobre a paralisação das atividades pelos juízes em protesto contra a aprovação do PL nº 4850/16 pela Câmara dos Deputados.

Inicialmente, a Amatra 13 reconhece ser o advogado essencial à administração da Justiça, a teor do art. 133 da Constituição Federal, e dessa forma compreende a necessidade de convívio harmonioso e respeitoso entre o Poder Judiciário e a classe dos advogados.

Dentro dessa perspectiva, a Associação repudia as assertivas generalizadas, e sem parâmetros objetivos, por parte do referido advogado, porquanto dissociadas da verdade, na medida em que os magistrados trabalhistas paraibanos cumprem seus deveres funcionais, inclusive com excelentes índices de produtividade que podem ser verificados através de simples consulta ao portal de transparência do Tribunal Regional do Trabalho da 13ª Região.

A Amatra 13 pontua não haver qualquer registro de reclamações, junto à Corregedoria do TRT da 13ª Região, relacionadas à morosidade processual, inassiduidade, ou descumprimento dos deveres institucionais pelos juízes que atuam nas Varas do Trabalho de Campina Grande.

Em arremate, a Associação, reconhecendo a importância da advocacia para a consolidação e o aprimoramento de nossas instituições democráticas, conclama a classe para que se junte à magistratura e ao Ministério Público na luta pelo combate à corrupção e pela preservação das garantias constitucionais que asseguram um sistema de Justiça independente e altivo em prol da sociedade brasileira.

João Pessoa, 02 de dezembro de 2016.

Juiz do Trabalho André Machado Cavalcanti

Presidente da Associação dos Magistrados do Trabalho da 13ª Região (Amatra 13)

ABUSO DE AUTORIDADE E PENA DE APOSENTADORIA DE MAGISTRADOS – MITOS E VERDADES

Artigo publicado no site:  Estadão Política  

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“Uma mentira repetida mil vezes torna-se verdade”. A frase, atribuída a Joseph Goebbels, ministro da propaganda nazista, explica o porquê de o senso comum acreditar que a aposentadoria compulsória remunerada é a pena máxima prevista na lei para magistrados vitalícios. Examinemos o que é verdade e o que é mentira nesse discurso.

Como todo e qualquer cidadão ou servidor público, os juízes respondem pelos crimes que praticam, podendo ir para a cadeia, ter seus bens confiscados para ressarcir e perder o cargo, sem direito à aposentadoria. O mesmo vale para promotores e procuradores.

O juiz Nicolau dos Santos Neto, conhecido como Juiz Lalau, foi condenado a mais de 26 anos de reclusão, em regime fechado, pelos crimes de peculato, estelionato e corrupção passiva, pelo desvio de R$170 milhões das obras do fórum trabalhista de São Paulo. A sentença ainda o condenou à perda do cargo, sem direito à aposentadoria. O ex-juiz Lalau, que teve seus bens confiscados para ressarcir os prejuízos, cumpriu parte da pena na penitenciária de Tremembé, outra parte em prisão domiciliar e, por fim, foi beneficiado por indulto concedido pela presidente Dilma.

O juiz João Carlos da Rocha Matos, por sua vez, foi condenado a 12 anos de prisão em regime fechado, por formação de quadrilha, denunciação caluniosa e abuso de autoridade, dos quais cumpriu quase 8 anos na cadeia. Depois, foi novamente sentenciado a mais 17 anos de prisão, também em regime fechado, pelos crimes de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-juiz Rocha Matos, que se encontra atualmente preso e cumprindo pena, foi ainda condenado à perda do cargo, sem direito à aposentadoria, e teve mais de R$77 milhões de reais em dinheiro apreendidos e confiscados.

O problema é que são raros os casos em que as penas da corrupção são aplicadas – apenas 3 a cada 100 desses casos são punidos no Brasil. Os exemplos dos ex-juízes Rocha Matos e Nicolau dos Santos Neto são oásis de Justiça no deserto de impunidade da corrupção.

A percepção geral de impunidade que cerca Ministério Público e Judiciário é a mesma percepção quanto à impunidade dos corruptos. Ela decorre da morosidade e das brechas da lei que protegem os réus do colarinho branco. Os juízes e promotores que cometem crimes ou faltas funcionais graves se beneficiam do mesmo sistema processual e recursal caótico e irracional que favorece colarinhos brancos em geral (como foi o caso do procurador de Justiça e ex-senador Demóstenes Torres), o qual convida a defesa a plantar nulidades, adubar com chicana e colher impunidade.

A solução para esse problema é clara. As dez medidas contra a corrupção, rejeitadas pela Câmara dos Deputados nesta semana, oferecem soluções para esse problema, porque propõem tornar mais célere e efetivo o processo de punição. Acabam com os recursos protelatórios, agilizam a solução dos processos, permitem a execução provisória da condenação, reduzem os casos de cancelamento da pena pela prescrição, fecham as brechas para a anulação de casos e facilitam a recuperação do dinheiro público roubado. O pacote anticorrupção se aplica integralmente a juízes e promotores e endurece as penas também para eles.

Além disso, acabar com o foro privilegiado daria mais agilidade às punições de magistrados. Proposta com esse objetivo foi aprovada pela Comissão de Constituição e Justiça do Senado (PEC 10/2013) e conta com o nosso o apoio e o de todas as associações de magistrados judiciais e do Ministério Público. Contudo, o Congresso resiste em acabar com essa proteção dada também aos parlamentares que são investigados ou réus, inclusive ao presidente do senado, Renan Calheiros.

A PEC 291/2013, que tramita na Câmara e que já foi aprovada no Senado, propõe acabar com a pena disciplinar de aposentadoria compulsória de magistrados e criar a ação civil de perda do cargo (sem direito à remuneração). Aprová-la é outra medida importante e apoiamos que isso aconteça. Não hesitamos em apoiar propostas que cortem a carne apodrecida do corpo do Ministério Público e do Judiciário.

Existe ainda um substitutivo ao projeto de lei de abuso de autoridade de Renan Calheiros, que um grupo de senadores apresentou e que moderniza a lei de abuso de autoridade, pune a carteirada, mas sem criar instrumentos de intimidação e de acovardamento da Justiça. Apoiamos esse projeto.

Agora, o que vários congressistas querem fazer é algo completamente diferente. Com o discurso falacioso de solucionar esse problema, alguns parlamentares propuseram mudanças na Lei de Abuso de Autoridade. O objetivo não é, na verdade, enquadrar juízes que abusam de seu poder. O objetivo é retaliar as investigações, intimidar a Lava Jato, cercear as grandes investigações e ferir de morte a atuação independente do Judiciário e do Ministério Público.

Para manipular a opinião pública, citam o caso do juiz que mandou prender a agente de trânsito que tentava guinchar seu carro. Falam em punir a carteirada. Só que não. A ironia suprema é que tanto o projeto de abuso de autoridade de Renan Calheiros, como a Lei da Intimidação que a Câmara aprovou nesta semana, não punem essa atitude. Não preveem tornar crime a carteirada.

Por outro lado, tais projetos criam crimes com redação sujeita a ampla interpretação – como “proceder de modo incompatível com a dignidade ou o decoro do cargo”- ou que amordaçam promotores e juízes, proibindo-os de conceder entrevistas sobre processos, ou que ameaçam punir juízes e promotores pela interpretação que fizerem da lei ou dos fatos (crime de hermenêutica).

O objetivo, portanto, não é o de coibir o abuso de autoridade, nem o de reduzir a sensação de impunidade. O que querem é intimidar e acovardar o Sistema de Justiça do Brasil. Querem proteger os parlamentares acusados de corrupção que correm risco de ser punidos, fomentando a impunidade, a insegurança, e com isso fornecer blindagem eficiente para corruptos e criminosos em geral. O projeto de abuso de Renan e da Câmara, como dizem os ingleses, “throws the baby out with the bath water” (joga fora o bebê com a água do banho).

O que a Câmara fez na última semana foi aproveitar que os brasileiros dormiam e choravam a tragédia da Chapecoense para, na calada da noite, trucidar as dez medidas contra a corrupção e aprovar a Lei da Intimidação.

Modernizar a lei de abuso de autoridade é uma necessidade. Criar crimes que acovardem o sistema de Justiça é um retrocesso civilizatório. A Lava Jato não é do Ministério Público ou do Judiciário e não temos poderes para defendê-la contra maiorias raivosas no Congresso Nacional. Está nas mãos da sociedade escolher o destino que quer para nosso país.

*Por Helio Telho e Deltan Dallagnol, procuradores da República Artigo publicado no site: http://politica.estadao.com.br/blogs/fausto-macedo/abuso-de-autoridade-e-pena-de-aposentadoria-de-magistrados-mitos-e-verdades/

A AMATRA 10 TAMBÉM É CHAPECOENSE

chapecoA AMATRA 10 transmite a todos os familiares dos que estavam no vôo do Chapecoense suas condolências e sua solidariedade

QUESTÕES DE RELEVÂNCIA PÚBLICA SÃO RESOLVIDAS PELA JUSTIÇA DO TRABALHO POR MEIO DA CONCILIAÇÃO. SAIBA MAIS.

[caption id="attachment_1811" align="alignleft" width="225"]a644b6aa-6f3a-4ca3-b3fd-cabdd93fbd44 Foto: Rosarita Caron[/caption]

É necessário que a população saiba que nem sempre o processo é resolvido com a prolação da sentença.

Na Justiça do Trabalho muitas demandas são resolvidas com a conciliação. Muitos transtornos para a sociedade são evitados em audiências que duram seis, sete ou até mesmo 12 horas ou mais. Muitas negociações são presididas por Juízes de primeiro grau, Desembargadores e até Ministros do TST.

O Artigo do Ministro Emmanoel Pereira, atual vice-presidente do TST, demonstra esses casos que não chegam ao conhecimento dos cidadãos brasileiros.

Rosarita Caron

Justiça invisível

Num país em que a precariedade dos serviços de saúde pública é obstáculo para a prestação de um atendimento digno à população, as negociações conduzidas no Tribunal Superior do Trabalho (TST) conseguiram cessar uma greve, em 18 Estados, de empregados dos hospitais universitários.

A Olimpíada de 2016, sob o risco da greve dos trabalhadores do setor elétrico, foi beneficiada com o afastamento de tal ameaça após negociações envolvendo todas as partes.

Esses casos recentes são emblemáticos da importância da Justiça do Trabalho na sua função de conciliadora e pacificadora social, papel pouco percebido pela população.

Tal função tem sido exercida com sucesso em conflitos coletivos de outras categorias nacionais que envolvem empresas de importância vital no cotidiano da população, a exemplo dos Correios, da Companhia Brasileira de Trens Urbanos (CBTU) -responsável por transportar milhares de pessoas todos os dias- e das companhias aéreas.

Podemos citar, ainda, a Casa da Moeda do Brasil, cuja ameaça de greve poderia comprometer a confecção dos passaportes e das medalhas dos Jogos Olímpicos. Mais recentemente, foi celebrado acordo entre a Embrapa e seus servidores, garantindo a continuidade dos serviços.

Mais que julgar processos e garantir os direitos dos trabalhadores, a Justiça do Trabalho atua na pacificação das relações de trabalho, dirimindo conflitos e garantindo um ambiente propício não só para o trabalhador, mas para a população e para o setor produtivo.

Considerando apenas o ano de 2016, as negociações coletivas mediadas pelo TST envolveram mais de 200 mil empregados, evidência de que a conciliação tem se mostrado eficiente instrumento para aliviar a escalada desmedida de processos no Judiciário.

Segundo o relatório "Justiça em Números" de 2016, elaborado pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 25,3% das sentenças e decisões na Justiça do Trabalho resultaram em acordo, índice que corresponde a mais do dobro apresentado pela Justiça Estadual.

A política de conciliação, já arraigada na cultura da Justiça do Trabalho, pode igualmente explicar o sucesso da última Semana Nacional da Conciliação Trabalhista, organizada pela vice-presidência do TST e pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CJST).

Em apenas cinco dias, mais de 160 mil pessoas foram atendidas em 1.061 audiências que culminaram com a solução de 27.475 processos e R$ 627 milhões em acordos celebrados.

Vivemos uma era em que a Justiça do Trabalho tem obstinadamente empenhado esforços para ultrapassar o fosso existente entre o Judiciário, o cidadão trabalhador e o cidadão empregador. Há muito o trabalho deixou de significar submissão de homens a outros homens.

O efetivo cumprimento dessa honrosa função, que busca resgatar os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa numa sociedade discriminatória e extremamente desigual, implica a afirmação da importância da Justiça do Trabalho.

De forma silenciosa e resoluta, tem contribuído para a aplicação dos direitos sociais e a valorização da cidadania e da paz social.

emmanoel-pereira-ministro-do-tst EMMANOEL PEREIRA é vice-presidente do Tribunal Superior do Trabalho e gestor da Política Nacional de Conciliação Trabalhista.

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